| CRÍTICAS | Uma Rapariga com Sorte

Normalmente, quando se fala em rock-and-roll-movies, toda a gente fala dos filmes do Elvis. E, esporadicamente, alguém se lembra de High School Confidential, com o Jerry Lee Lewis. Infelizmente, nunca ninguém se lembra de Uma Rapariga com Sorte. E bem que ele merecia ser mais vezes lembrado…

Uma Rapariga com Sorte começa logo por mostrar no título (o original, claro) que não é mais um rock-and-roll-movie pateta como tantos outros – em plena década de 50, foi preciso coragem e arrojo para baptizar o filme com o título da música de um negro, Little Richards (vénias). E depois, a cena inicial, em que o protagonista fala directamente com o espectador, enquanto opera mudanças técnicas no próprio filme – passando o filme para formato cinemascope, de forma a captar toda a excelência do mundo do rock and roll -, comprova que Uma Rapariga com Sorte não tem nada de datado.

O filme passa-se no tempo em que o rock and roll tinha a ver com ser jovem, ser hedonista e ser rebelde. É aqui que conhecemos Fatso Murdock (Edmond O’Brien), um mafioso com ânsias de fama, que já foi o rei das slot-machines e que pretende voltar às bocas do mundo. Por isso, recorre a outra indivíduo que também já bateu no fundo: Tom Miller (Tom Ewell), agente musical que descobriu, por exemplo, Julie London, e que se afundou devido ao alcool. O objectivo é fazer com que a sua noiva, a bela Jerri Jordan (Jayne Mansfield), se transforme na nova rainha da música.

Jayne Mansfield (suspiro), famosa pin-up dos anos 50 e conhecida por muitos como a Marilyn Monroe dos pobres, nunca teve muito jeito para a representação, mas aqui não era isso que lhe era pedido. Em Uma Rapariga com Sorte, Mansfield só tem que fazer aquilo que sabia fazer melhor: bambolear-se e fazer boquinhas sexys, para que toda a gente se apaixone por si. É mais ou menos como em Doidos Por Mary. No entanto, o único que não pode apaixonar-se por si é o seu novo agente, uma vez que ela é a noiva do seu patrão. Lembram-se de Pulp Fiction?

Uma Rapariga com Sorte é uma comédia screwball bastante divertida, com grande conotação sexual (e às vezes até bastante à frente do seu tempo), embrulhada num pomposo embrulho rock and roll, por onde desfilam várias estrelas do género a interpretarem grandes clássicos: o próprio Little Richards (mais vénias), com The Girl Can’t Help It; Gene Vincent (outras tantas vénias), com Bebop A Lula; Eddie Cochran (véna), com 20th Flight Rock; ou Fats Domino, Julie London e os Platters.

Mas onde Uma Rapariga com Sorte ganha verdadeiramente pontos é na subversão que faz ao mundo do espectáculo. É que nem Jayne Mansfield quer ser cantora – quer apenas ser uma dona de casa feliz, que possa cozinhar para o seu marido (ironia das ironias) -, nem o seu agente quer que ela cante, apesar de ter tudo para singrar no mundo do espectáculo. Além disso, faz ainda uma crítica com tanto de feroz como de subtil ao próprio show-business, onde as estrelas são criadas pelo poder do dinheiro e dos negócios obscuros.

E se O Prisioneiro do Rock n Roll criou o primeiro teledisco de sempre, Uma Rapariga com Sorte trouxe ao mundo o primeiro teledisco de terror de sempre, com o fantasma de Julie London a interpretar de forma magnífica o clássico Cry Me a River, como podem testemunhar no vídeo seguinte (patrocinado, lá está, pelo maravilhoso mundo do youtube) – numa sequência com algumas reminiscências do pesadelo do DumboUma Rapariga com Sorte é um recheado Le Big Mac. Um Le Big Mac do rock!!!Título: The Girl Can’t Help It
Realizador: Frank Tashlin
Ano: 1956

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