| CRÍTICAS | Clerks

Foi com Clerks, um pequeno filme artesanal e independente (quando independente significava mesmo um cinema à margem de qualquer financiamento das grandes produtoras, mas também de qualquer convenção cinematográfica), que Kevin Smith se estabeleceu como uma das vozes mais respeitadas de uma certa cinefilia mais nerd e geek. No mesmo ano em que um certo Quentin Tarantino apresentava um certo Pulp Fiction em Cannes, Smith fazia com Clerks a segunda parte de um tremor de terra que mudaria para sempre a face do cinema norte-americano.

Clerks é autêntico cinema de guerrilha. Filmado com os meios que Kevin Smith tinha ao dispor (tanto técnicos como humanos), na loja de conveniência onde ele próprio trabalhava e, portanto, rodado sempre em horários pós-laborais. Isso obrigou-o a pôr o filme a preto e branco para uniformizar diferentes tipos de iluminação, mas conseguindo com isso um efeito de um certo cinema arthouse, mas sobre temas banais e comuns, trazendo o cinema de autor para os terrenos do cinéfilo comum.

O filme é o simples apanhado de vários episódios ao longo de um dia e trabalho de dois trabalhadores (Brian O’Halloran e Jason Mewes) de uma loja de conveniência e de um clube de vídeo respectivamente, que funcionam lado a lado. É um filme feito sobretudo dos diálogos, com aquele jeito muito escorreito e baseado nos acontecimentos mundanos do dia-a-dia ou em cultura popular, do qual o cinema de Tarantino também é feito. Mais tarde, Jim Jarmusch (outro realizador nascido dentro deste cinema independente) faria o mesmo com o seu Café e Cigarros, conjunto avulso de diálogos mais ou menos banais em mesas de café.

Além disso, Clerks é ainda o retrato geracional de uma juventude entediada, que teve como proto-heróis aquela dupla stoner que era Beavis e Butthead. Ou seja, a mesma geração que teve como hino aquele tema que gritava no refrão entertain us. E talvez por isso mesmo, Kevin Smith enche o filme de rock’n’roll pré-grunge, ou seja, antes do grunge se chamar grunge. Clerks viria a abrir a porta a um universo muito próprio, personificado pelos próprios Beavis e Butthead de Smith, o seu Jay e Silent Bob, que depois fariam alguns filmes bons (olá Dogma) e outros… menos bons (alguém mencionou Perseguindo Amy?). No entanto, o McRoyal Deluxe de Clerks é um hamburga especial, que contém os pozinhos de perlimpimpim dos marcos da sétima arte.Título: Clerks
Realizador: Kevin Smith
Ano: 1994

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