| CRÍTICAS | O Homem do Cemitério

O Homem do Cemitério é o verdadeiro filme de culto: uma obra que desperta reacções de amor e ódio tão proporcionalmente díspares (basta ver como na recente Sessão de Culto no Espaço Nimas houve gente a abandonar a sala frustrada, enquanto os restantes se regozijavam nos seus lugares), suficientemente conhecida entre os apreciadores do género mas ainda mais desconhecida entre a maioria dos cinéfilos e que, normalmente, surge associada a comentários como o de Martin Scorsese, que certa vez declarou que este era um dos melhores filmes italianos dos anos 90. Como se isto não bastasse, há ainda uma aura de mistério em seu redor, uma vez que o seu realizador, Michele Soavi, é uma figura mais ou menos misteriosa, com poucos trabalhos no currículo e muitos mitos urbanos (não necessariamente reais) associados ao seu nome.

Livremente inspirado na popular banda-desenhada Dylan Dog – que é criada pelo mesmo autor do romane em que o filme se baseia, Tiziano Sclavi – O Homem do Cemitério é a história de um tipo, Francesco (Rupert Everett), que é o segurança do cemitério lá do lugarejo onde vive. Ajudado pelo ligeiramente lelé da cuca Gnaghi (François Hadji-Lazaro) – que, tal como o Silent Bob de Kevin Smith, não fala durante todo o filme, abrindo apenas a boca no momento exacto para dizer aquilo que faltava ser dito -, Francesco garante que os mortos recentemente enterrados e que, por qualquer motivo obscuro, regressam à vida sete dias depois, não saiam lá para fora e criem o pânico e o terror.

Portanto, O Homem do Cemitério é um filme de zombies, mas como qualquer obra deste género, estes servem essencialmente como metáfora para reflectir sobre qualquer coisa. E O Homem do Cemitério é um filme sobre o amor e a morte – tal e qual o nome do protagonista, Dellamorte da parte do pai e Dellamore da parte da mãe – montado à maneira dell’arte. Ou seja, uma comédia à italiana com um formato quase de episódios, que vão servindo para abordar vários temas: o amor e a morte, claro, mas também o fascismo, a política e, no fundo, tudo aquilo que faz parte da nossa vida.

Recorrendo também aquele humor brega, do qual Peter Jackson fez escola desde o seu Carne Humana Precisa-se, O Homem do Cemitério vai passando por vários géneros – o giallo, claro, mas também o filme de fantasmas ou a comédia burlesca -, sempre com um estilo inventivo por parte de Michele Soavi por trás da câmara. Ou seja, mesmo quando o filme começa a cair na repetição das suas metáforas, este nunca se torna repetitivo porque o realizador tem sempre um truque na manga, um plano mais arriscado ou uma composição de cena bem esgalhada.

E se tudo isto não resultar, eis que entra em cena a bela Anna *suspiro* Falchi, a modelo de origem finlandesa que está para o filme da mesma forma que estão os mortos-vivos. No entanto, enquanto estes últimos estão para a morte – o dellamorte do título – ela está para o amor – o dellamore. Série b e onirismo, filme de zombies e comédia circunstancial, crítica velada e humor brega… Tudo isto são os ingredientes de um McBacon que define na perfeição o que é essa coisa de cinema de culto.Título: Dellamorte Dellamorte
Realizador: Michele Soavi
Ano: 1994

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