| CRÍTICA | A Loja dos Horrores

É impossível não adorar Roger Corman, o rei dos baixos orçamentos. Super-produtor, com quase 400 filmes no currículo, Corman começou a sua carreira aliando à produção as funções de realizador. Por exemplo, só em 1960, ano deste A Loja dos Horrores, o cineasta fez produziu e dirigiu quatro filmes. Para a história ficam os dois(!) dias de filmagens deste A Loja dos Horrores, um dos seus maiores clássicos e que deu azo a um dos mais irreais remakes de sempre, A Lojinha Dos Horrores. Ele mesmo já explicou como é que se faz: basta uma sala com um par de móveis. Depois muda-se o plano, move-se a mobília de sítio e desfoca-se a câmara um pouco e voilá, eis uma variedade infindável de decors.

A Loja Dos Horrores é o típico flick de Roger Corman: um filme de terror low budget e com raízes na série B, com uma forte componente humorística que nem sempre é propositada. Filmes como A Loja dos Horrores preconizaram o espírito de outras comédias de terror de espírito niilista, como Morte Cerebral ou, especialmente, Gremlins.

Encontramos então uma pequena loja de flores no centro do problemático bairro de Skid Row, propriedade de Gravis Mushnik (Mel Welles). A trabalhar consigo está Seymour Krelboin (Jonathan Haze), um desajeitado pateta que abusa do humor físico, num registo semelhante ao de Jerry Lewis, com uma expressão de marca com que termina todas as frases e que faz sangrar dos ouvidos – I didn’t mean it. Quando está prestes a ser despedido, Seymour saca de um trunfo da manga: uma planta exótica que anda a plantar às escondidas e que se vai tornar num centro de atracções, fazendo a loja prosperar e o pobre diabo cair nas boas graças do patrão.

Mas o narrador e o jazz da banda-sonora dizem-nos que o que estamos a ver é um(a tentantiva de) film-noir e, por isso, sabemos que, mais cedo ou mais tarde, algo irá correr mal. Por isso, até surgirem homicídios e detectives de chapéu e gabardine é só uma questão de tempo. É que a tal planta, baptizada de Audrey Junior, é uma planta carnívora gigante, com um apetite voraz por carne humana e que até fala(!): feed me, diz recorrentemente com as suas mandíbulas de cartão. Seymour vai então alimentá-la com uma série de cadáveres ocasionais: um desiquilibrado atropelado pelo comboio, um assaltante, uma prostituta demasiado literal ou um dentista que perece após um duelo de bisturis(!).

A Loja Dos Horrores é um filme completamente ao lado. Abusa do humor físico e pateta, que nós já não suportamos por estar tão batido (alerta Os Malucos do Riso), mas também cria uma espécie de humor que é uma espécie de mistura entre o ZAZ style, dos Aonde Pára a Polícia e afins, e o absurdo dos Monty Pythons, por exemplo. Só que declaradamente tongue in cheek, que é mais irreal ainda. E, por falar nisso, também anda por lá o Jack Nicholson no seu primeiro papel no cinema, na pele de um tipo masoquista. Excelente introdução ao caos surreal que é o remake dos anos 80, A Loja Dos Horrores é um dossier de cinema, de cultura popular e de como comer McBacons.

Título: The Little Shop Of Horrors
Realizador: Roger Corman
Ano: 1960

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