| CRÍTICAS | Santa Sangre

Santa Sangre, realizado depois do falhanço da adaptação de Dune, é um filme com todas as características do cinema de Alejandro Jodorowsky: a luxúria, o surrealismo, a crítica religiosa, o simbolismo e o sensacionalismo gratuito. Além disso, Santa Sangre é, possivelmente, o filme mais convencional e acessível de Jodorwosky, se exceptuarmos estes documentários biográficos que ele anda a fazer agora. Convencional apenas na medida em que é possível identificar um princípio, um meio e um fim. Porque de resto mantém-se a desmedida ambição por algo claramente superior. È o tradicional desabafo de que nem sempre percebemos o que estamos a ver, mas nunca o iremos esquecer. E é este o melhor elogio que se pode fazer ao mestre chileno.

Santa Sangre é a história de Fenix (Axel Jodorowsky), um jovem traumatizado que, através de um flashback, descobrimos o porquê do seu internamento num hospício: quando era novo, Fenix presenciou a mutilação da sua mãe (Blanca Guerra), uma devota religiosa pagã, por parte do próprio pai (Guy Stockwell), o dono de um circo muito peculiar. Afectado, Fenix vai embarcar numa obsessão pela própria mãe, regressada do mundo das trevas para o ordenar a matar indiscriminadamente.

A sinopse é curta e até com pouco interesse, mas pouco ou nada revela do próprio filme. Este é um daqueles filmes em que é quase impossível escrever seja o que for, uma vez que a sua função é mesmo ser visto. Mesmo que encontremos mensagens sobre a obsessão (lembram-se de As Mãos De Orlac? Santa Sangre não tem muito a ver, mas é sempre uma excelente oportunidade para relembrar este clássico do cinema fantástico) e sobre o tempo cíclico, onde a história se repete e só pode ser quebrada por um amor puro, aqui sob a forma de uma menina surda-muda e com a cara pintada de branco (Sabrina Dennison).

Santa Sangre tem momentos inesquecíveis – a morte de um elefante, trágica e sangrenta; a mutilação da mulher-tatuada, que é a mais fantástica homenagem ao giallo italiano que alguma vez se fez; a referência ao cinema mexicano com um combate de wrestling entre alguns luchadores mascarados e uma mulher-gigante chamada… El Santa; um dos mais oníricos circos da sétima arte, em que as suas aberrações não são tratadas como seres humanos a encarnar uma personagem circense (como em Parada de Monstros), mas antes figuras alternativas que vivem mesmo assim; e a mais provocadora igreja pagã, onde se adora uma imagem de uma barbie em tamanho real amputada. Em suma: não conhece a obra de Jodorowsky, Santa Sangre é o documento ideal para iniciar a aventura de descoberta. E o McBacon não é nada um desfavor.

Título: Santa Sangre
Realizador: Alejandro Jodorowsky
Ano: 1989

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *