| CRÍTICAS | Manobras na Casa Branca

Um presidente norte-americano é apanhado num escândalo sexual e, para encobrir a situação, a Casa Branca enceta uma guerra. Faz-vos lembrar alguma coisa? Se pensaram em Bill Clinton, Monica Lewinsky e guerra do Iraque, então… estão enganados. É que Manobras na Casa Branca é totalmente ficção. Tão ficção que só pode ser verdade, não é? Como diz a tagline do filme, uma comédia sobre a verdade, a justiça e outros efeitos-especiais. É caso para dizer que, caso não tivesse sido escrito e produzido antes do escândalo Lewinsky, que ninguém acreditaria que não era baseado em factos reais.

Manobras na Casa Branca é então a história de um presidente dos Estados Unidos que, a uma semana das eleições em que a vitória parece mais do que assegurada, se vê envolvido numa acusação de assédio sexual por parte de uma escuteira. Depois de contratarem o resolvedor de problemas, Conrad Brean (Robert de Niro), que é uma espécie de Mr. Wolf dos meandros da política, a equipa presidencial vai buscar um famoso produtor de Hollywood (Dustin Hoffman) para encenar uma guerra fictícia contra a Albânia. E porquê a Albânia? E porque não? Ninguém sabe nada da Albânia e os únicos albaneses famosos são os irmãos Belushi (e Jim tem um cameo precioso, a fazer dele próprio). Mais uma vez, a ficção a ser mais real do que a realidade, já que, dois anos depois, os Estados Unidos lideraria o triste bombardeamento da NATO na Sérvia para proteger os muçulmanos da… Albânia no Kosovo.

Manobras na Casa Branca é como Capricórnio Um, aquele filme que mostrava como os Estados Unidos encenavam a ida à lua, mas mostrando como é que se inventa uma guerra. Nesta era moderna em que vivemos, em que tudo está em directo na televisão (e a guerra do Iraque foi a primeira a ser televisionada), parece que é impossível falsear-se o que quer que seja. Mas Manobras na Casa Branca mostra como é precisamente o contrário. E não é por acaso que o realizador Barry Levinson está constantemente a usar imagens de televisão ou de CCTV, por entender o poder das imagens. Uma guerra é só mais um espectáculo, com slogans, banda-sonora a condizer (e Willie Nelson está sempre presente para compor uma cantilena a propósito) e figurantes especiais. Em mais uma jogada de antecipação de génio (e simultaneamente assustadora), Manobras na Casa Branca antecipa as fake news em duas décadas.

Escrito por David Mamet, Manobras na Casa Branca é um daqueles filmes palavrosos, que iriam depois ser o molde de coisas como Os Homens do Presidente ou mesmo o House of Cards. No entanto, é um filme bem mais leve que esses títulos sobre a política (e que são tão ou mais assustadores que este pela forma como podem ser tão reais), que recorre à comédia para dizer coisas sérias a brincar. Robert de Niro e Dustin Hoffman, especialmente este último, fazem o filme com uma perna às costas e há uma série de secundários de luxo que dão brilho à coisa. Principalmente Kirsten Dunst, que faz de albanesa(!) numa espécie de spot publicitário a puxar ao tearjerker para justificar a invasão bélica, e Woody Harrelson, que é o soldado que decidem deixar para trás nas linhas do inimigo para ensaiar uma evasão heróica para depois descobrirem que ele é descompensado mentalmente.

O problema de Manobras na Casa Branca é que, à medida que vai avançando, vai também perdendo força, como se o filme começasse a deixar de acreditar nas suas próprias mentiras que vai criando em catadupa (porque as mentiras são como as cerejas, vêm sempre umas a seguir às outras). Isso faz com que termine em perda, não lhe dando a consistência cuja pertinência temática merecia. Mas mesmo assim é um McBacon que se come sem fastio.Título: Wag the Dog
Realizador: Barry Levinson
Ano: 1997

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