| CRÍTICAS | Anomalisa

As neuroses e as obsessões sempre foram terreno fértil para muitos humoristas. O Woody Allen que o diga, ele que tem construído uma carreira respeitável à conta das suas inseguranças e crises pessoais. E logo a seguir vem o Larry David. Anomalisa, a segunda experiência na realização do (habitual) argumentista Charlie Kaufman, é um filme que aborda todas essas depressões. Mas sem a parte do humor. Só mesmo a parte das depressões.

O que fica é então um filme extremamente depressivo (não confundir com deprimente), mas em que isso não é depreciativo. Anomalisa está mais perto de Todd Solondz, o rei dos deprimidos, do que nunca. Esta é a história de um homem simples, Michael Stone (David Thewlis), um autor especialista na optimização do serviço ao cliente (haverá algo mais deprimente?) que vive infeliz no conformismo cinzentão da sua vida. Aliás, esta é tão mundana que todas as pessoas restantes têm a mesma cara (e a voz de Tom Noonan). E ele não sabe como sair desse abismo.

Até que, numa viagem de negócios para uma convenção onde vai discursar, Michael Stone conhece por acaso uma mulher que lhe vai alterar a vida rotineira. Essa mulher, aparentemente desinteressante, não só é a única que tem feições diferentes das do resto da multidão, como tem uma voz especial (que é a de Jennifer Jason Leigh). Aliás, quando ela canta a capelaGirls Just Wanna Have Fun, Charlie Kaufman faz da Cindy Lauper o mesmo que Contado Ninguém Acredita fazia de Wrecking Eric. Essa mulher, Lisa, é uma anomalia na vida de Michael. Ou melhor, uma… anomalisa.

Anomalisa é um pequeno filme de formato quase caseiro, em que Charlie Kaufman mantém-se fiel aos seus temas favoritos, mas sem os devaneios do costume (mesmo que haja uma sequência de um pesadelo que grite por todos os lados O Despertar da Mente). A novidade aqui é que é… uma animação com marionetas em stop motion, que leva este género, normalmente conotado com os mais novos e a histórias mais escapistas, para os terrenos pantanosos do existencialismo. E isso torna-o, de certa forma, desconfortável. (nota de rodapé: Anomalisa é o primeiro filme de animação para adultos (seja lá isso o que for) a ser nomeado para o Oscar respectivo.)

Anomalisa é um filme fora do baralho, uma pequena pérola em que Charlie Kaufman (auxiliado por Duke Johnson) firma os pés do chão para reflectir sobre as nossas próprias vidas, as nossas expectativas e, sobretudo, o nosso ideal de futuro. Qual é o sentido da vida? Não é isso que Kaufman pretende responder, ele só quer que nos confrontemos com os nossos falhanços e que saibamos conviver melhor com eles. E isso, é um facto, torna-se mais fácil de barriga cheia, empanturrados com um Le Big Mac.

Título: Anomalisa
Realizador: Charlie Kaufman & Duke Johnson
Ano: 2015

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