| CRÍTICA | América Proibida

Houve uma altura que o mundo parecia que ia ser de Edward Norton. Depois de arrasar na estreia com A Raiz do Medo, seguiram-se mais dois títulos incríveis (este América Proibida e Clube de Combate) que formavam uma trilogia que parecia indicar que nada podia correr mal. Só que não, não é? Também outro Edward, o Furlong, teve o seu momento de graça. Com Exterminador Implacável 2 cavalgou a onda do fenómeno, mas nunca chegou perto de cumprir qualquer expectativa aceitável de carreira. Ambos cruzaram-se em América Proibida, filme que, de uma forma ou de outra, marcou as suas carreiras.

Os dois são irmãos numa típica família dos subúrbios norte-americanos, algures em Los Angeles. Quando o pai, bombeiro de profissão, morre no serviço, Edward Norton vai abarcar os ideais de direita mais extremistas, intoxicado pela propaganda de um neo-nazi disfarçado que chega ao bairro (Stacy Keach). Quanto a Edward Furlong, vê no mano mais velho um ídolo a copiar, mesmo quando ele acaba por ir preso por matar dois negros (naquela cena que provavelmente toda a gente conhece mesmo sem ter visto o filme e que, sem adiantar muito, pode-se dizer que redefine o conceito de lancil do passeio…). E enquanto Norton está na prisão, toda a gente olha para Furlong como uma versão mais nova dele. O próprio começa o seu ensaio sobre a sua relação de ambos, que escreve para a escola, com a frase quando as pessoas olham para mim eles vêem o meu irmão.

América Proibida é uma espécie de primo não muito afastado de Os Marginais. Ou seja, um drama de irmãos numa família sem uma figura paterna, em que esta é substituída pelo filho mais velho e que o mais novo tem que arcar com o peso da responsabilidade de lhe vir a suceder. Aliás, a estrutura de América Proibida é quase um espelho da de Os Marginais, já que ambos os irmãos mais novos são a figura central (mesmo que não sejam os protagonistas principais (ou será que são?)) ao serem eles que contam a história que estamos a ver, à medida que a vão vertendo para o papel. Só que América Proibida é um Os Marginais com neo-nazis em vez de greasers e socs.

Edward Norton, com um físico considerável e uma suástica tatuada no peito, impõe respeito. É ele que domina as ruas do seu bairro e que acaba preso durante três anos, como consequência dos seus actos. E, no entanto, América Proibida não é tanto um filme sobre a extrema-direita como parece, até porque os seus argumentos são sempre os do costume do nacional-socialismo. É mais um drama sobre o peso das expectativas, sobre o papel dos géneros na sociedade ocidental (especialmente o masculino, que muitas vezes é secundarizado perante a discriminação mais ou menos permanente do género feminina) e uma grande competição de testosterona e sobre quem tem a pilinha maior.

Edward Norton e Edward Furlong são assim duas personagens fortíssimas e isso é o melhor e o pior de América Proibida. É que elas sugam tudo à sua volta e o realizador Tony Kaye nunca consegue arranjar espaço no argumento para as secundárias. Todas as outras personagens são meras figuras de papel, que aparecem e desaparecem, ou que são apenas arquétipos para fazerem valer uma posição. O exemplo mais flagrante é o de Guy Torry, personagem super-irritante que vai ter um papel determinante na transformação de Norton durante o período de filme de prisão (juntamente com a outra cena fortíssima de América Proibida, que envolve [spoilers] violação no chuveiro), e que é o negro-espirituoso-e-empático-com-o-seu-quê-de-Morgan-Freeman-circa-Os Condenados de Shawshank.

Tony Kaye, realizador de telediscos, vê-se assim à rasca para conseguir safar-se com América Proibida, até porque decide não seguir a via mais fácil e opta pela estrutura narrativa não-cronológica. E, por entre um preto e branco contrastado, câmaras lentas antes do slo-mo de alta definição ser uma cena e muitos planos de escala televisiva, consegue sair por cima. América Proibida pode não ser um filmaço, como o seria nas mãos de alguém mais experiente, mas dois actores em estado de graça e uma temática mais do que pertinente, fazem deste um dos McBacon mais bem cotados do cinema dos anos 90. Título: American History X
Realizador: Tony Kaye
Ano: 1998

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