| CRÍTICAS | Duro de Matar

O que vou escrever a seguir pode parecer muito estranho para os leitores mais novos, mas juro que é absolutamente verdade. Já houve uma altura, e não foi assim há tanto tempo quanto isso, que os filmes do Steven Seagal estreavam no cinema. É verdade! E esse fenómeno paranormal aconteceu até ao ano da graça do senhor de 2002, altura em que estreou este Duro de Matar*.

*em 2010, Seagal voltaria ao grande ecrã, com Machete, mas isso é outra história

Duro de Matar é uma xungaria de proporções épicas, daqueles filmes tão maus que se tornam bons. E depois dá a volta e tornam-se maus novamente. Ora vejamos: dez anos após O Rochedo, a prisão de Alcatraz é reactivada, porque o mundo está mais perigoso e violento. No entanto, ao contrário do filme de Michael Bay, a prisão aqui só tem duas salas: uma espécie de pátio de escola e outra que é tipo hangar. É para aqui que vão ser levados Steven Seagal e Ja Rule, condenados a 2 e 5 anos respectivamente após um violento e mortífero tiroteio com a polícia(!).

Duro de Matar deveria ser um buddy movie, mas rapidamente se desvanece qualquer ideia de parceria entre Seagal e Ja Rule porque, como se sabe, o primeiro não tem uma pinga sequer de empatia em todo o corpo. A sua ideia de representação é manter uma cara séria o tempo todo, como se toda a gente lhe devesse alguma coisa, independentemente da situação.

Mais incompreensível é a sua opção por usar bandana durante todo o filme. Aliás, todos os prisioneiros de Alcatraz as usam, já que aqui não há qualquer farda ou código de vestuário. O charme do cinema xunga… Em Duro de Matar, Steven Seagal assume-se como um whitey. Só não se percebe é se o é por convicção própria ou para combinar apenas com o hip-hop da banda-sonora e com todo o ambiente afro, que é transversal ao filme.

Entretanto, na prisão está também um condenado à morte, prestes a fritar na cadeira eléctrica, sem revelar onde escondeu todo o outro que roubou antes de ser apanhado. Por isso, momentos antes de puxarem a alavanca para baixo, uma equipa de bandidos especiais invade alcatraz para lhe arrancarem essa informação a força. E esse é o pior plano de sempre da história dos vilões do cinema: não conseguem obter a localização do outro (nem sequer chegam a conseguir assustar o homem), têm baixas consideráveis logo a abrir e o plano de fuga falha miseravelmente.

A partir daqui arranca a xungaria, até porque estão todos fechados numa ilha-prisão de onde ninguém pode fugir (talvez por isso os prisioneiros, quando vêem as suas celas abertas, decidem todos ir… jogar básquete(!)). Portanto, Duro de Matar é uma variação do Força em Alerta, mas numa prisão em vez de um submarino. E como qualquer bom série b, há fogachada com fartura e bodycount elevado, tudo muito gratuito e devidamente mal explicado (ou, simplesmente, inexplicado de todo), a saber: munições infinitas, bandidos que descem dos céus pendurados em cabos que estão atados a Deus-sabe-o-quê, rockets que são abatidos por rajadas de metralhadora e muita gente a desviar-se a torto e a direito de saraivadas de tiros.

Até ao final há ainda mais dois momentos altamente inexplicáveis. Um tem a ver com os créditos finais, que rolam enquanto um diálogo entre um dos prisioneiros (que então percebemos que fora, durante todo o filme, uma tentativa frustrada de comic relief) e a sua namorada, numa cena que pertence claramente a outro filme (ou a um episódio ainda mais infeliz de Os Batanetes); e o outro tem a ver com o director da prisão, o cubano Tony Plana, que está sempre a falar espanhol e que, no final, diz a um prisioneira almas nalgas. Não sei o que significa, mas é incrível. Almas nalgas, homeby, someone is here to see you, diz ele em tom paternalista. Amo! Agora pensem: se Duro de Matar é tão mau que se torna bom e leva para casa apenas um Happy Meal, imaginem se ele fosse apenas mau.

Título: Half Past Dead
Realizador: Don Michael Paul
Ano: 2002

8 thoughts on “| CRÍTICAS | Duro de Matar

  1. mais uma vez uma crítica melhor que o filme todo.

    na altura em que ví esta coisa já tinha deixado de gostar dos filmes de steven seagal, os últimos que vira tinham sido sempre o mesmo: ele chega a uma cidade remota e distribui pancadas em pessoas que querem estragar o ambiente e fica com a milf lá do sítio.

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