| CRÍTICAS | Forever Pure

O Beitar de Jerusalem, a equipa de futebol israelita mais popular do país (sendo inclusive o clube do primeiro-ministro Benyamin Netanyahou), é também conhecida pelas suas conotações movimentos mais radicais e extremistas. Os seus ultras, a claque La Familia, orgulha-se de serem o clube mais racista de Israel e de serem a única equipa que nunca contratou árabes para o seu plantel.

Até que Arcadi Gaydamak comprou o clube. Este oligarca russo tinha como objectivo tornar-se no presidente da câmara de Jerusalém e viu no futebol a melhor forma para escalar socialmente até ao poder. O plano não resultou, o tiro saiu-lhe pela culatra e Gaydamak procurou virar-se para outras direcções. E, por qualquer motivo, decidiu contratar dois jogadores chechenos, aproveitando os seus contactos naquela região separatista. Corria a época de 2012/2013. E, de repente, foi o caos.

Por serem muçulmanos, Zaur Sadayev e Dzhabrail Kadiyev foram encarados como árabes, naquela confusão clássica entre ambos os conceitos que, afinal, não é um clássico apenas em Portugal. Por isso, os ultras do Beitar revoltaram-se. Afinal de contas, como um diz às tantas, deixaria a sua filha sair com um árabe? Ainda lhe perguntam como é que isso é comparável, mas a pergunta cai no vazio. Afinal de contas, a lógica não é propriamente o ponto forte dos racistas.

Forever Pure segue todo este processo, desde o início – contextualizando bem a presença de Arcadi Gaydamak na liderança do clube -, até ao final da época, com a documentarista Maya Zinshtein a acompanhar de perto os episódios mais importantes desta triste história. Nunca se aproxima demasiado, mas não deixa escapar o mais importante, tentando evitar ao máximo as cabeças falantes, mas fazendo as entrevistas necessárias quando a historia assim o exige. E tem-nos a todos: os dois jogadores, o capitão de equipa que entretanto é escorraçado pelos adeptos por não alinhar com as críticas deles, o presidente, os adeptos…

Depois, o twist decisivo: o ponta-de-lança Sadayev provoca a afronta final, ao… marcar um golo! De imediato, os adeptos do Beitar abandonam o estádio, boicotando o resto da época. Até ao final, Forever Pure é uma tragédia shakespereana, com os adeptos a dividirem os próprios jogadores e o futebol a ficar definitivamente arredado para segundo plano. Apesar de não se safar a parecer um pouco uma espécie de reportagem com melhores valores de produção, Forever Pure é um excelente documento para perceber como o racismo e a discriminação estão impregnados nas pessoas, muitas vezes sem elas perceberem. E este McBacon pode ainda servir para algumas pessoas da nossa bola perceberem algumas coisas, if you know what I mean. Afinal de contas, o futebol é a mais importante de todas as coisas sem importância.

Título: Forever Pure
Realizador: Maya Zinshtein
Ano: 2016

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