| CRÍTICAS | Era uma Vez um Rapaz

A escrita de Nick Hornby até podia ser a mais banal de sempre, que nós continuaríamos sempre a gostar dele. É que é fácil identificar-nos com as suas personagens (sempre com um toque autobiográfico, como as de Woody Allen), jovens adultos inseguros e neuróticos com a vida do dia-a-dia, assim como com as referências da cultura popular (filmes, música e futebol) que utiliza amiúde.

Em Era uma Vez um Rapaz podemos ficar com algumas dúvidas sobre quem é o verdadeiro protagonista do filme. Será Hugh Grant, um solteirão que nunca precisou de trabalhar porque vive dos royalties de uma popular canção de Natal que o seu pai compôs em tempos e que assim se dedica a coleccionar conquistas femininas, em esquemas que deixariam orgulhoso Barney Stinson (e que inclui, por exemplo, inventar um filho fictício para sacar mães divorciadas em grupos de apoio)? Ou será o então muito jovem Nicholas Hoult, um miúdo que tem que lidar com o bullying na escola por ser um freak inadaptaado e com as tendências depressivas e suicidas da mãe, em casa?

Pois bem, a resposta a esta questão é só uma: ambos são o protagonista. E são ambos porque Hugh Grant e Nicholas Hoult, apesar de serem diferentes à primeira vista, são as duas faces da mesma moeda. Não é por acaso que os realizadores, os manos Weitz, utilizam os dois como narradores do filme e, muito menos, que se vão complementar tão bem e tornarem-se os melhores amigos, depois do período inicial de repulsa.

Não deixa de ser também curioso ver como Era uma Vez um Rapaz desconstrói a imagem de Hugh Grant enquanto galã, com a qual construiu a sua carreira, fazendo dele um womanizer que se orgulha em ser uma ilha, citando Jon Bon Jovi (piada privada para com quem viu o filme). No entanto, ainda no mesmo ano, o actor inglês estrearia Amor Sem Aviso e O Amor Acontece, redefinindo o conceito de ironia.

Com o mesmo à-vontade e savoir faire de Alta Fidelidade, a mais bem sucedida das adaptações cinematográficas de Nick Hornby, Era uma Vez um Rapaz sabe ser simples sem ser simplista e ser ligeiro sem ser fútil. E, mais ou menos a brincar, diz mais coisas a sério do que muitos dramas de faca e alguidar. É precisamente isso que gostamos na literatura de Hornby, essa capacidade de nos identificarmos com aquelas personagens, em situações pelas quais nós mesmos também poderíamos estar. Se bem que acho que é bem mais provável irmos todos comer um McRoyal Deluxe juntos, do que frequentarmos grupos de apoio a pais divorciados para conhecermos mulheres.,

Título: About a Boy
Realizador: Chris & Paul Weitz
Ano: 2002

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *