Nós não somos más pessoas, mas fizemos uma coisa má. É este o lema que atravessa a primeira temporada de Bloodline, enquanto assistimos à iminentemente trágica história da família Rayburn. E é uma história a que vale a pena assistir.
Esta talvez não seja a melhor série para quem gosta de se sujeitar a um turbilhão de estímulos com explosões, gritaria, suspense, magia, efeitos especiais ou finais rocambolescos feitos mesmo à medida para o espectador soltar um surpreendido “Ahhhh! ‘Tá boa!”. Logo nos primeiros momentos de Bloodline, o final é-nos oferecido um pouco como a banda corajosa que toca o seu maior sucesso logo para abrir o concerto para que, resolvido o assunto, possa ir ao que verdadeiramente interessa.
Entre as personagens principais não temos nenhuma que seja essencialmente boa nem nenhuma que seja essencialmente má, mas vamos navegando por areias movediças morais, alternando entre o desprezo e a simpatia à medida que todos os espacinhos da história vão sendo preenchidos. Ao fim de não se sabe bem quantos anos, Danny, o filho mais velho volta à casa de família, que é também um bed and breakfast em Key Largo, na Florida. Nessa altura sabemos duas coisas: ele parece ser o elemento disruptivo numa família que, de outra forma, parece viver em absoluta harmonia e, no final da história, um dos seus irmãos vai carregar o seu corpo já morto para se livrar do cadáver. É o que está nesse meio que dá consistência às personagens e interesse à história. Não é à espera de um final surpreendente que se vê esta série.
Bloodline tem boa história, boas personagens e boa representação e isso chega para automaticamente se qualificar como série que vale a pena ver mas quando isso tudo é posto de forma tão competente num cenário caribenho em tom de film noir, esse é o golpe de misericórdia. A primeira temporada de Bloodline é boa “televisão” (entre aspas porque é produção do Netflix) e pronto. A história é carregada devagar, em lume brando sem nunca dar a sensação de estar a ser apressada e o espectador tem o prazer de ver a vida daquela gente toda a desabar ao mesmo tempo.
A forma como a história se encontra tão perfeitamente auto-contida na primeira temporada, torna difícil uma segunda e explica que, mesmo no último episódio se martelem mecanismos para justificar uma nova temporada. Isso faz-nos perguntar, como já aconteceu com outra séries, aliás, se algumas não ficariam melhor restringidas a uma temporada que englobasse perfeitamente uma história ao invés de se sujeitarem a criar pontas por atar para justificar mais episódios. Seja como for, Bloodline merece ser vista com calma e aproveitando cada momento de evolução das personagens porque é para isso que elas lá estão, para percebermos a origem de cada uma das coisas más que as pessoas boas fazem.