O boy meets girl é provavelmente o mais básico, antigo e comum dos plots que existem para o cinema (ou para a literatura, claro), com milhentas variações. Essa lista inclui também o overcoming the monster, o plot em que o protagonista tem que derrotar ou ultrapassar um antagonista qualquer, o que inclui o sub-género do filme de vingança. Moritz Mohr, o realizador de Contra Todos, faz um trocadilho com tudo isto no título original do filme – Boy Kills World -, já que é um vengeance movie hiperbólico sobre um rapaz (Bill Skarsgård, que nem sequer tem nome, é simplesmente o… boy. Podia ser mais arquétipo que isto?) contra o mundo.
Contra Todos passa-se num estado autoritário qualquer, que tem uma tradição que parece A Purga: todos os anos, a déspota local, Hilda Van Der Koa (Famke Janssen), organiza aquilo a que chamam O Abate, um evento público onde os inimigos do Estado são convocados e mortos num programa de televisão altamente patrocinado por uma marca de cereais(!). No entanto, apesar do humor, pouco ou nada há aqui de crítica ao consumismo (Paul Verhoeven continua a ter o monopólio disto). Entretanto, a mãe e a irmã de Bill Skarsgård hão de ser mortas num dos Abates e ele, a quem cortarão a língua e furarão as orelhas, será acolhido por um xamã (Yayan Ruhian do The Raid) no meio da selva, que o vai treinar para ser uma arma mortífera nas artes do kung fu e poder-se vingar um dia no futuro.
Contra Todos começa realmente quando Bill Skarsgård inicia então o seu processo de vingança. Vai ser uma saga épica, contra tudo e contra todos (a tradução portuguesa do título não é por acaso), que vai incluir toda a família Van Der Koy (destaque para Sharlto Copley, um dos filhos Van Der Koy e artista falhado, que procura compensar essa ambição com discursos pomposos e uma grande fanfarronice pseudo-intelectual), uma assassina profissional de capacete (Jessica Rothe) e muitos (muitos mesmo) capangas.
Tal como o The Raid, Contra Todos é um arraial de porrada, que procura que cada sequência de pancada seja sempre maior e ais longa do que a anterior. Por isso, no final, existe um duelo entre Skarsgård e Ruhian que se prolonga para lá do expectável, fazendo com que a cena de porrada do Eles Vivem pareça razoável. E Moritz Mohr procura também incluir sempre algo de novo em cada cena, seja umas cenas em POV, seja um novo nível de wi-fu, seja umas coreografias que ninguém estava à espera. A câmara, que nunca para e flutua e rodopia pelo meio de toda a gente, é que pode ser um pouco demais, mas para compensar há uma sequência numa cozinha, com um passevite, que fica para a posterioridade.
Não, Contra Todos não é um filme sofisticado. É uma sessão de pancadaria de meia-noite e que, tendo em conta o que tem para oferecer, o entrega em bandeja de prata. Não podemos pedir mais. Contra Todos é excitante, entretém e entusiasma e, mesmo com as suas 2 horas de duração, nunca enfada. E, por isso, saca o McRoyal Deluxe sem esforço. Se pedirem um filme de acção é isso que levarão daqui.
Título: Boy Kills World
Realizador: Moritz Mohr
Ano: 2024