| CRÍTICAS | A Favorita

Depois de ter dado o salto para Hollywood, chega a altura do grego Yorgos Lanthimos experimentar o filme de época, naquele que é o seu primeiro trabalho com um argumento alheio. E, de repente, trememos com a ideia de um filme de época, com todo o protocolo da corte inglesa do século XVIII, pela mão do actual rei dos formalistas.

E, no entanto, A Favorita acaba por ser o menos calculista dos filmes de Lanthimos. O que não quer dizer que este abandone aqui o formalismo imaculado. A Favorita é o mais diferente trabalho de toda a sua filmografia e, contudo, tem a sua marca autoral por todo o lado. Parece um paradoxo, mas tendo em conta que estamos a falar do mesmo tipo que realizou o absurdo de A Lagosta ou Canino, isso não é assim tão descabido. Eugène Ionesco teria gostado.

A Favorita é um jogo pelo poder nos bastidores da coroa inglesa no início do século XVIII, em que Rachel Weisz e Emma Stone não olham a meios para cair no goto de Ana, Rainha da Grã-Bretanha, França e Irlanda (Olivia Colman). E quando dizemos todos os meios, estamos mesmo a dizer todos os mesmos. O House of Cards ao pé destas mulheres são uma cambada de meninos de coro.

Não é a primeira vez que vemos esta história, que se tem repetido ao longo da história, mas A Favorita tem duas particularidades. A primeira é que esta é uma variação feminista desse triângulo em disputa por atenção e ascendente sobre os restantes, num filme cheio de girl power que, inevitavelmente, rima com os tempos de hoje dos movimentos #metoo. E a segunda é um certo anacronismo que Lanthimos nos atira à cara de vez em quando, como pequenas explosões, seja na parte sexual (pouco explorada nestes filmes de época), na linguagem (mais crua do que habitual) ou até, timidamente, nas roupas. E aquela cena de dança, que podia ter sido ali metida por Tarantino, é a cereja no topo do bolo.

A Favorita é um excelente triângulo dramático de três actrizes em estado de graça, de quem é difícil dizer de quem gostamos mais. É como escolher entre o pai e a mãe. E é, ao mesmo tempo, desorientador como qualquer filme de Yorgos Lanthimos. E isso é um elogio. Mais um Le Big Mac, para um dos grandes cineastas da actualidade.

Título: The Favourite
Realizador: Yorgos Lanthimos
Ano: 2018

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