| CRÍTICAS | Gretel & Hansel

Uma das coisas que mais surpreende quem for ler pela primeira vez os contos dos Irmãos Grimm – autores profícuos de algumas das mais famosas histórias infantis, da Branca de Neve à Rapunzel – é a sua negritude. Normalmente, os contos são mais cruéis do que esperaríamos de uma história para crianças. Sabiam que há um (que é referido por alto no filme de que vos vou falar nas linhas seguintes, daí que este apontamento não seja totalmente gratuito) em que uma madrasta assassina o enteado, cozinha-o e da-lo a comer ao pai e depois ele regressa e mata-a também em vingança?

Gretel & Hansel é uma nova interpretação do popular conto dos Irmãos Grimm (que, no Brasil, se chama João e Maria, lol), sobre os dois irmãos que, abandonados na floresta pelos pais, encontram uma casa feita de gengibre governada por uma bruxa, mas através dessa perspectiva mais negra. E sublinhando bem essa negritude. Além disso, altera o título e coloca o nome da irmã primeiro, dando-lhe uma força mais feminista. Afinal de contas, se é a mana que salva o dia, também passará ela a ser aqui a protagonista.

Gretel (Sophia Lillis) é então mais velha e, por isso, é a ela que o irmão acompanha e não o contrário. A mãe, sozinha e pobre, expulsa-os de casa por não ter dinheiro para os alimentar, na esperança que aprendam a governar-se sozinhos. Gretel havia recusado trabalho na casa dum senhor rico, que pretendia em troca outro tipo de favores… Por isso, depois da breve ajuda um lenhador de bom coração, os manos irão encontrar a tal casa de uma bruxa, que não é feita de gengibre, mas que tem uma arquitectura bem interessante, sendo bem mais espaçosa no interior do que o exterior dava a imaginar.

Para escurecer esta simples história, Oz Perkins utiliza uma fotografia cuidada, tirando partido da noite e dos “mistérios” da floresta, reforçando tudo com uma banda-sonora opressora (leia-se manipuladora) e muitos símbolos pagãos. No início a coisa cola-nos ao ecrã, mas à medida que o tempo vai passando ficamos cada vez mais com a sensação de que Oz Perkins está só a recriar uma série de coisas que viu noutros filmes, sem saber muito bem para onde vai.

É quando entra em cena a bruxa (excelente Alice Krige) que o filme se torna num beco sem saída. Sem ter para onde ir, Gretel & Hansel começa a reciclar simbologia de forma inconsequente e a chover no molhado. Fia-se demasiado na atmosfera criada, mas, mesmo sendo um filme curtindo, não deixa de ser cansativo e aborrecido. Não é mau – o cinema de terror gosta muito destas pérolas de autor -, mas parece ser sempre uma cópia de algo mais. É falhado, mas é uma tentativa de algo. O terror gosta destes Cheeseburgers, mas não gosta assim tanto deste.

Título: Gretel & Hansel
Realizador: Oz Perkins
Ano: 2020

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