Existem coisas que é impossível um homem aguentar. Assassinar a mulher ou violar a filha ainda é suportável – afinal de conta, deslizes todos nós temos, não é? -, mas agora matarem-nos o cão é que não! É isso que o filho do líder da máfia russa local (Alfie Allen, que é bem possível ser o gajo mais odiável do cinema e, portanto, o tipo perfeito para fazer de mau) faz a Keanu Reeves. E isso é um grande erro! Porque Reaves vai vingar-se como se não houvesse amanhã.
Keanu Reeves é então John Wick, um ex-assassino a soldo que é obrigado a voltar da reforma para fazer a folha aqueles que lhe mataram o cão (e a mulher, antes do cão). Um revenge movie simples que descarta toda a gordura acessória, mas extremamente eficaz, seguindo a fórmula que Busca Implacável veio reavivar nos últimos anos: uns bandidos metem-se com o tipo errado e aqui vai fruta!
John Wick é o veículo perfeito para a inexpressividade de mármore de Keanu Reeves, que ainda tem possibilidade de colocar em prática uns truques de artes marciais de que tanto gosta. O realizador Chad Stahelski, conhecido duplo de Hollywood (foi, inclusive, o duplo de Reeves em Matrix), estreia-se na cadeira de realizador com um filme altamente estilizado, lembrando os ambientes nocturnos e urbanos de Michael Mann, filmado sempre à noite e quase sempre com chuva, o que lhe dá um certo ar cool. É o primeiro neo-noir de pancada de meia-noite.
John Wick é ainda reminiscente dos heróis silenciosos (e com cara de quem tem dor de barriga) de Jean-Pierre Melville, se bem que aqui o modelo não é Ofício de Matar mas antes O Círculo Vermelho (que o filme cita directamente numa homenagem que lhe fica bem). Com umas coreografias desempoeiradas e um bodycount elevado (este é um daqueles filmes em que o número de mortos é sinal de qualidade), John Wick tem apenas vinte minutos a mais, que são enxertados sem necessidade a uma história de vingança que deveria ter terminado quando… o herói alcança a sua vingança. No final, Keanu Reeves leva para casa um pitbull para substituir o seu beagle morto, numa metáfora tão básica quanto evidente (no início era um carinhoso beagle e, ao terminar o filme, é já um temível pitbull), e nós levamos para casa um McBacon para jantarmos sem fastio.
Título: John Wick
Realizador: Chad Stahelski
Ano: 2014
Não havia muita gente a pôr dinheiro em John Wick antes da sua estreia. Afinal de contas, parecia ser apenas mais um revenge movie movido a muita violência estilizada e bodycount elevado, realizado por um ex-duplo. No entanto, mais uma vez a realidade veio provar que não há nenhum algoritmo ou AI que consiga prever estas coisas. Numa mistura perfeita entre o net cred de Keanu Reeves, o fenómeno viral e um filme sem merdas, surgia um novo favorito do público, que tornava inevitável a sequela.
John Wick 2 suspende o revenge movie, mas apesar de lhe dar algo de novo, mantém os ingredientes do seu sucesso. E amplia-os ao dobro. Ou seja, o bodycount é duplicado, as sequências de acção tornam-se mais longas e mais estilizadas e as perseguições ficam ainda mais espectaculares. Tudo sem perder um pingo de coolness, à medida que John Wick se vai transformando num franchise e começamos a mergulhar naquele universo de assassinos a soldo, algures entre a banda-desenhada para adultos e um James Bond super-vitaminado.
Depois de interromper a sua reforma (e de recuperar o seu carro, que no filme anterior tinha ficado na posse dos russos), John Wick é visitado por um italiano, Santino D’Antonio (Riccardo Scamarcio), que traz uma encomenda: a morte da sua irmã, Gianna (Claudia Gerini), de forma a controlar a Camorra. John Wick não pode dizer que não, por causa do código dos assassinos, e depois de despachar o trabalho… volta tudo ao revenge movie, já que Santino não só rebentou com a sua casa, como faltou à palavra.
John Wick 2 continua a ser um filme de acção que bebe directamente à economia dos série b, ao mesmo tempo que começa a incluir elementos que vão criando seu próprio universo, que é muito particular. É um mundo de assassinos a soldo com regras muito bem definidas, de classe alta, que quase se passa numa realidade alternativa. E é quando aparece Laurence Fishburne, enquanto líder de uma gangue que domina as ruas de Nova Iorque, que ficamos com a certeza que John Wick se transforma naquilo que Matrix deveria ter sido.
Quando John Wick descobre que tem uma recompensa sobre a sua cabeça e que tem toda uma comunidade de matadores de alto gabarito na sua peugada, John Wick 2 quase que se transforma num computador, em que Keanu Reeves salta de nível em nível, enquanto despacha malta em diferentes cenários. A diferença para um jogo de computador convencional é que aqui há um boss a cada 5 minutos. E, mesmo assim, Chad Stahelski ainda consegue manter o mesmo McBacon do filme antecessor. Quem diria que seria um ex-duplo a vir ensinar esta malta toda a fazer filmes de acção?
Título: John Wick 2
Realizador: Chad Stahelski
Ano: 2014
Depois do sucesso dos dois primeiros filmes, John Wick 3 – Implacável já chegou a nós como um dos filmes mais aguardados do ano. E fiel à máxima de que em equipa que ganha não se mexe. Chad Stahelski continuou na cadeira de realizador, Derek Kolstad como argumentistas e Keanu Reeves já garantiu que, enquanto o público quiser, ele continuará a ser John Wick, o mais implacável dos assassinos a soldo.
John Wick 3 – Implacável é também o consolidar do franchise, o filme em que mergulhamos de cabeça nas estruturas que sustêm aquela comunidade de assassinos de alta classe. Começa exactamente no momento em que terminou John Wick 2: John Wick tem que fazer pela vida e, depois de quebrar as regras da guilda, tem que arranjar uma solução imaginativa.
John Wick vai ter que sacar de todos os seus trunfos da manga, enquanto continua a despachar malta como se não houvesse amanhã. O bodycount continua a subir e as perseguições a serem ainda mais espectaculares. E ninguém deixa de ser cool. Com tudo isso, revela-se também mais uns pozinhos da origem de Keanu Reeves e, adivinhem! Afinal ele não é russo, mas sim bielorrusso.
Há umas novas aquisições ao elenco, com destaque para Halle Berry, apenas porque, com ela, vêm dois novos cães. São dois pastores alemães altamente participativos nas sequências de luta, que são um óptimo extra ao filme. E ajudam na metáfora de John Wick com os canídeos. Se no primeiro era um beagle inofensivo que se transformou no pitbull furioso do segundo tomo, aqui ganha um instinto caçador à semelhança daqueles pastores alemães.
Em John Wick 3 – Implacável já não há como escapar. Ao terceiro McBacon seguido estamos completamente enredados na série, já só queremos que venha o quarto filme (se bem que já se fala em spin-offs, o que pode começar a significar o princípio do fim) e que se lixe o Matrix 4. Aliás, o que é mesmo o Matrix?
Título: John Wick 3 – Parabellum
Realizador: Chad Stahelski
Ano: 2019