| CRÍTICAS | Escrito no Vento

Douglas Sirk é o pai, o avô e o padrinho do melodrama. Na sua obra cabe toda uma tradição de dramas de faca e alguidar, desde Rainer Werner Fassbinder a Pedro Almodóvar, até às variações televisivas, das novelas tipo Dallas às produções da Globo. Alguém devia escrever uma tese de mestrado sobre esta herança. E quando o fizerem, Escrito no Vento será um dos principais filmes eleito, até porque é um percursor da telenovela, que começa com um genérico e tudo, cortesia dos Four Aces.

A abertura de Escrito no Vento é, aliás, genial. Ao som dessa theme song, somos introduzidos às personagens do filme. Vemos Robert Stack a conduzir a alta velocidade, bêbado, e a irromper casa adentro, onde está Lauren Bacall e Dorothy Malone. Ouvem-se gritos e um tiro. A tragédia não só é anunciada, como concretizada, mas fora de plano. A câmara desliza até à secretária e foca um filofax, que a corrente de ar faz deslizar as páginas para trás. É lançado o flashback e Escrito no Vento inicia-se então verdadeiramente.

Escrito no Vento é um quadrado amoroso, que se desenha entre o playboy ricaço (e atormentado) com queda para a pinga Robert Stack, a sua nova diva acabadiça de conhecer Lauren Bacall, o melhor amigo, o trabalhador e mui íntegro Rock Hudson, e a sua irmã, a espírito-livre Dorothy Malone. Um crítico escreveu em tempos uma sinopse de Escrito no Vento que ficou famosa: Dorothy Malone quer Rock Hudson, que quer Lauren Bacall, que quer Robert Stack, que só quer morrer…

Douglas Sirk dominava os símbolos do melodrama como ninguém, exagerando-os, mas sem os tornar em clichés. Não era só a trama que exagerava; era também a falsidade dos cenários ou a cor do guarda-roupa, em que tudo contribuía para um jogo de dicotomias, onde tudo era dito, mas muito mais ficava a pairar nas entrelinhas. Como, por exemplo, a tensão homo-erótica que há sempre no ar, entre Stack e Hudson: terá sido consciente por parte de Douglas Sirk ou somos só nós, sugestionados pela homossexualidade escondida de Rock Hudson, o galã perfeito de Hollywood que afinal gostava de homens?

Escrito no Vento é o melodrama até para quem não gosta de melodramas. E um McBacon até para quem não gosta de McBacons.

Título: Written on the Wind
Realizador: Douglas Sirk
Ano: 1956

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