| CRÍTICAS | O Terceiro Passo

No final do século XIX, Nikola Tesla, um dos maiores inventores de sempre, andou às turras com Thomas Edison devido às suas descobertas no campo da electricidade. Enquanto o primeiro defendia a corrente alternada, livre e gratuita para todo o mundo, o segundo defendia a corrente contínua, paga, e andou por todos os Estados Unidos a electrocutar elefantes para difamar o sérvio. É incrível como Hollywood nunca pegou nesta história que tem todos os condimentos de um blockbuster: eventos reais, um mocinho e um vilão bem definidos e uma intriga em três actos, com drama e tragédia.

E, no entanto, a coisa acabou por servir de pano de fundo para O Terceiro Passo, o filme de Cristopher Nolan sobre… magia. O que até faz sentido, tendo em conta que Tesla também sofreu com as acusações de feitiçaria, numa altura em que a crendice ainda era forte e a ciência muitas vezes comparada às forças do oculto. Apesar de precisarmos de todas as forças para manter a suspensão da descrença na altura em que entra essa parte, a incorporação de personagens e acontecimentos reais em O Terceiro Passo é uma das partes mais curtidas do filme de Nolan.

O Terceiro Passo é a história da never ending rivalry entre dois mágicos durante a época vitoriana, quando ser mágico era algo respeitável. Hugh Jackman tem o aspecto e o carisma de palco, mas Christian Bale tem o arguto e o jeito nato para aquilo. Ambos trabalharam como assistentes de um mágico veterano, mas quando a mulher de Jackman morre durante um truque por causa de um nó dado por Bale, vai nascer uma obsessão entre os dois que vai ser levada aos limites. No fundo, é um tema recorrente na filmografia de Nolan, de Memento a Insónia.

A rivalidade entre os dois vai ter o seu pináculo do toque do homem transportado. Enquanto Bale arranjou uma forma de o fazer em palco, Jackman vai pedir ajuda a Tesla, para criar uma máquina que torne a ciência em magia. É aí que a realidade se mistura com a ficção, com um David Bowie a fazer de Tesla, noutra opção de génio de Nolan. Afinal de contas, quem outra pessoa nos conseguiria convencer que era possível criar uma máquina de teletransporta a partir da electricidade se não alguém bigger than life?

No entanto, o grande trunfo de O Terceiro Passo não é esse nem sequer a reconstituição de época impecável. É antes a estrutura narrativa, cheia de analepses e prolepses, que tornam a leitura do filme mais desafiante e propícia às várias cambalhotas do argumento. Michael Caine há de andar para lá a dar o seu toque de classe, Scarlett Johansson também e até Andy Serkis tem uma curta, mas interessante participação. Tudo isso permite que o twist final não seja algo apenas espertalhão, como seria nas mãos de um M. Night Shyamalan. O Terceiro Passo é claramente um filme de realizador e um McRoyal Deluxe com a assinatura de Nolan, com tudo o de bom (e de mau) que isso comporta.

Título: The Prestige
Realizador: Cristopher Nolan
Ano: 2006

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