| CRÍTICAS | 4 Quartos

Os filmes colectivos, feitos a várias mãos, são uma ideia que resulta muito bem no papel, mas que raramente têm sucesso na prática. Na teoria tem tudo para ser a melhor ideia de sempre: convida-se os realizadores de quem gostamos, escolhe-se os melhores actores do momento e pedimos-lhes para fazerem um filme. O que pode correr mal? O problema é que, 95 por cento das vezes, o resultado final acaba por ser desequilibrado, os segmentos raramente colam entre si porque têm estilos muito diferentes e, quando chega ao fim, a nossa reacção é… meh. E isso impede-nos de ver mais filmes de grupo? Claro que não, antes pelo contrário.

4 Quartos, sem ser propriamente espectacular, é uma das excepções que, pelo menos, vale a pena rever de tempos a tempos. Passa-se num hotel, numa noite de passagem de ano, e compila quatro histórias, cada uma passada num quarto diferente. Obviamente que cada um desses segmentos é assinado por um realizador diferente: Allison Anders, Alexandre Rockwell, Robert Rodriguez e Quentin Tarantino. As histórias têm em comum o bell boy, interpretado de forma muito burlesca e física por Tim Roth – por vezes a exagerar nos maneirismos, mas claramente um dos pontos de interesse do filme -, que logo na cena inicial recebe o testemunho do velhote bell by do hotel, que se prepara para ir para casa.

Dos quatro intervenientes, Tarantino e Rodriguez são os dois nomes sonantes, se bem que na altura ainda não o eram tanto. Contudo, quase 20 anos depois, são os únicos que confirmaram os créditos. Allison Anders e Alexandre Rockwell (quem?) perderam-se na espuma da rebentação. Coincidência ou não, os seus segmentos são também os mais desinteressantes de 4 Quartos. Comecemos então do melhor para o pior.

A história de Tarantino, que encerra o filme (e interpretada pelo próprio, com a ajuda de alguns habitués, incluindo um Bruce Willis não creditado por questões sindicais), é uma recriação de The Man from the South, o icónico episódio do Alfred Hitchcock Apresenta com o Steve McQueen e o Peter Lorre. Nesse filme, Lorre é um apostador inveterado que aposta o seu carro com McQueen como esse não consegue acender o isqueiro dez vezes seguidas. Caso perca, McQueen tem de cortar o mindinho. Tarantino, a fazer dele próprio (ou seja, de realizador de sucesso excêntrico), quer repetir o truque e, para isso, pede ajuda a Tim Roth. O episódio é filmado com longos planos sequências e mais uma série de imagens de marcas do realizador: mulheres descalças, diálogos escorreitos que parecem rajadas de metralhadora e carradas de referências pop. No final, Tim Roth dá a machadada final de génio, no pun intended.

O outro episódio que merece destaque, taco a taco com o de Tarantino, é o terceiro, assinado por Robert Rodriguez. E também este reflecte várias imagens de marca do seu autor, começando logo por um dos seus actores-fetiche: Antonio Banderas, com quem tinha acabado de rodar Desperado (vénias com saída à retaguarda). Contudo, o segmento é antes um balão de ensaio para os futuros Spy Kids. Enquanto Banderas e a espoja vão curtir o revelhão, os dois filhos ficam sozinhos no quarto, sob a revisão esporádica de Roth. Até o quarto irromper em chamas e cadáveres virem à tona, no pun intended, é um pulinho. Divertido e lúdico qb, como Rodriguez faz bem nos seus momentos bons.

Finalmente, os episódios de Allison Anders e Alexandre Rockwell são aqueles que costumam levar mais pancada. O de Anders, que abre o filme, até arrecadou um Razzie, para a prestação de Madonna. No entanto, não é assim tão ruim como o pintam. É a história de um grupo de bruxas que se reúne para desfazer a maldição de uma colega transformada em pedra, onde, além de Madonna (que tem piada pelas suas ligações à cabala e à wicca), há ainda Lili Taylor ou Valeria Golino. Como alguém se esquece de trazer o esperma indispensável para o feitiço (porque i engoliu com o entusiasmo… oops), lá chamam Tim Roth para uma mãozinha, no pun intended. Por entre a comédia e uns truques de liberdade criativa, Allison Anders leva a água ao seu moinho, num segmento que vai crescendo em nós. Aliás, sempre que revejo 4 Quartos, gosto mais desta parte.

Finalmente, a parte de Alexandre Rockwell é uma bagunça. Como qualquer filme com David Proval, é um segmento com mafiosos, num jogo erótico que mistura perigo e sexualidade, entre o próprio Proval, a esposa Jennifer Beals e, claro, Tim Roth. Nunca se percebe bem qual é a verdadeira intenção do realizador ou da história e, mais uma vez, é Tim Roth quem salva a situação, especialmente num breve momento em que tenta fugir pela casa de banho. No final fazem-se as contas: duas histórias giras, uma mais ou menos e outra mais menos que mais, soma-se tudo, noves fora, mais coisa menos coisa e arredonda-se tudo para o McBacon.

Título: Four Rooms
Realizador: Allison Anders, Alexandre Rockwell, Robert Rodriguez & Quentin Tarantino,
Ano: 1995

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