Home Invasion é um filme… peculiar. Ou, pelo menos, difícil de descrever. Ou melhor, de rotular. É que não é um filme narrativo, com uma linha narrativa convencional nem uma ficção, mas também não é propriamente um documentário (ou, pelo menos, de acordo com as convenções tradicionais do género). É mais um ensaio, que tem como premissa o home invasion movie (esse sub-género do terror, que tem a sua génese no ido ano de 1909, pela mão de D. W. Griffith, em The Lonely Villa), mas que serve também para reflectir sobre espaço público e privado, as relações entre o Homem e a tecnologia, a vigilância massiva e a partilha de dados e… a história da campainha.
Na verdade, é mesmo a campainha a génese de Home Invasion e o seu conceito principal. Não só porque o filme começa com a história de Marie Van Brittan Broan, uma enfermeira negra norte-americana que via a sua casa ser repetidamente assaltada e a polícia, estruturalmente racista, ignorava sistematicamente as suas chamadas, o que a fez inventar o primeiro sistema de videovigilância doméstico moderno, mas porque é todo ele montado a partir de um círculo no centro do ecrã, qual olho de polícia, e com legendas deformadas como um olho-de-peixe.
A partir deste formato, o realizador (o debutante Graeme Arnfield, que diz ter feito o filme na cama) vai então contando as suas histórias e apresentando as suas conclusões e reflexões (Marie Van Brittan Broan, D. W. Griffith e o nascimento de um sub-género ou Jamie Siminoff, o inventor do Ring, uma campainha inteligente que grava automaticamente todo o movimento do alpendre da casa e partilha nas redes sociais), ilustradas com imagens de arquivo, cenas de filmes de home invasion (há de tudo, desde o Gritos ao Cães de Palha, passando por Os Bárbaros do Século XX) e muitos fragmentos do Ring, que se encontra no YouTube, com tentativas de assalto, entregas duvidosas dos estafetas dos correios ou animais avulso a activarem o sistema. Além disso, manipula a banda-sonora, com uma música intrusiva e cada vez mais alta, que vai despertando em nós uma sensação de alerta, de perigo e de desconforto quase permanente.
Home Invasion é assim um filme desafiante para o espectador, não só porque não segue as normas tradicionais do filme narrativo, mas porque nos obriga a sair do lugar de conforto durante toda a sua totalidade. E se, de início, o filme nos vai mantendo interessados e fascinados, não só graças às histórias de Graeme Arnfield, mas também às suas associações, que nem sempre são as mais óbvias, com o passar do tempo isso começa a tornar-se cansativo. E mesmo sem ser um filme longo – apenas uma hora e meia de duração -, a verdade é que as últimas duas histórias de Home Invasion já são difíceis de acompanhar com a mesma atenção das iniciais. Isso não quer dizer que o filme não seja uma proposta extremamente interessante, tanto na forma como no conteúdo, que merece um McBacon de destaque. O mais difícil será mesmo saber onde o encontrar para assistir.
Título: Home Invasion
Realizador: Graeme Arnfield
Ano: 2023