| CRÍTICAS | Só os Amantes Sobrevivem

Devíamos acarinhas mais Jim Jarmusch. Um dia vamos acordar de manhã e ele já não vai cá estar. E depois só aí é que lhe vamos sentir verdadeiramente a falta, culpando-nos por não lhe termos dado mais valor. Por isso, sempre que estreia um filme novo seu, isso devia ser um evento com mais pompa e circunstância.

Só Os Amantes Sobrevivem devia ter essa pompa e circunstância por vários motivos. Porque é o regresso de Jarmusch aos bons filmes, depois do fraquinho Os Limites Do Controlo; porque é a sua primeira incursão ao mundo dos vampiros, restaurando-lhes a reputação de marginais estilosos; e porque tem a Tilda Swinton a fazer de vampira milenar, papel que lhe cola que nem uma luva, com aquelas suas feições de cera.

Esqueçam os vampiros hipsters, que brilham e que são drama queens. Os vampiros de Só Os Amantes Sobrevivem são mais próximos dos de Anne Rice (e de Entrevista Com O Vampiro), outsiders que muito têm visto e, consequentemente, sofrido, com este nosso mundo esquisito – e Jarmusch esteve a ver, de certeza, Fome De Viver. E como seres imortais, só lhes resta dedicarem-se a uma coisa que realmente interessa: a arte. Ela (Tilda swinton) é mais livros e ele (Tom Hiddleston) é mais música. Ambos são amantes, mas ele vive em Detroit e ela em Tânger; e, perante a crise de meia-idade do primeiro, vão-se reunir novamente na motor city.

Em Jarmusch tudo tem uma razão de ser (como os seus nomes, ela é Eva e ele Adão, não podia ser mais simbólico) e a escolha de situar Só Os Amantes Sobrevivem em Detroit não é por acaso. Tal como a antiga meca industrial norte-americana, os dois protagonistas são um sinal de um tempo ido. E daí Tom Hiddleston estar tão deprimido com a acção dos homens, a quem eles tratam carinhosamente de zombies. Também não é por acaso que o seu contacto em Tânger é Cristopher Marlowe (John Hurt), o alegado autor das obras de Shakespeare.

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Por vezes, esse name dropping pode soar um pouco pretensioso. Mas os vampiros de Jarmusch são tão estilosos que nós absorvemos todas essas referências como uma questão de bom gosto, com a qual nos identificamos facilmente. Ou como private jokes, como quando vão ver a casa onde nasceu Jack White, amigo de Jarmusch, personagem do seu Café E Cigarros e um dos poucos nomes que realmente interessam na música deste século. Tudo ao mesmo tempo.

Depois, na últma parte do filme, cai um grão de areia na engrenagem que vai dar cabo da máquina. À vida do casal de protagonistas vai chegar Ava (Mia Wasikowska), a irmá de Eva, uma rebelde inconsciente que pode colocar tudo em jogo. A partir daí, o estilo contemplativo (europeu?) de Jarmusch ganha outro ritmo, nem para melhor nem para pior. Para diferente. E vai assim até ao McBacon final.mcbaconTítulo: Only Lovers Left Alive
Realizador: Jim Jarmusch
Ano: 2013

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