| CRÍTICAS | O Enfermeiro da Noite

Sempre existiu em Hollywood o fenómeno dos filmes duplicados, que de vez quando faz chega às salas, quase em simultâneo, dois filmes semelhantes sobre o mesmo tema. Vulcão e O Cume de Dante, Braveheart – O Desafio do Guerreiro e Rob Roy, Capote e Infame… a lista é imensa. No entanto, a Netflix, na sua ânsia autofágica, conseguiu ir ainda mais à frente. Em pleno ano da graça do Senhor de 2022, a plataforma de streaming produziu dois filmes sobre a mesma pessoa e lançou-os ao mesmo tema, capitalizando também a enorme popularidade das true crime stories.

O Enfermeiro da Noite é então o filme que complementa Capturing the Killer Nurse, num double bill sobre Charlie Cullen, um dos maiores serial killers da história. Cullen era um enfermeiro impecável e aparentemente altamente profissional que, veio a descobrir-se, matava pacientes aleatoriamente. No final, acabou condenado a perpétua por 29 mortes, mas estima-se que possam ter sido mais de cem. Ah, e há um plot twist. Antes de ser apanhado, graças às diligências nobres de uma companheira de profissão, Cullen fora despedido de sete outros hospitais, que encobriram todas as suspeitas da sua culpabilidade, com receio do que isso poderia significar para as suas receitas. Ou seja, o grande vilão de toda esta história é, na realidade, o sistema de saúde norte-americano, que continua a matar por ano muito mais do que qualquer serial killer.

Enquanto que Capturing the Killer Nurse é um documentário, O Enfermeiro da Noite é ficção. Eddie Redmayne, que quando apareceu prometia que ia estar em todo o lado e, afinal, eclipsou-se ligeiramente, faz de Charlie Cullen, ele que não poderia ser mais amigável e simpático e, portanto, perfeito para o papel. No entanto, o filme é antes de Amy Loughren (Jessica Chastain), a tal colega que o denunciou e que era, inclusive, amiga próxima. Outro plot twist: Cullen salvou mesmo a vida da amiga por puro altruísmo, provando pela enésima vez que ninguém é pura e simplesmente malvado só porque sim e que a banalidade do mal é mesmo a característica mais perturbadora do terror.

O Enfermeiro da Noite é um thriller assinado por Tobias Lindholm, dinamarquês mais conhecido pelo seu trabalho como argumentistas em filmes como Mais Uma Rodada ou A Caça. E, por isso, é filmado como só os nórdicos sabem fazer: com precisão glacial, enquanto cozinha em lume brando. É certo que por vezes parecer confundir discrição com falar baixo, mas pode ser também apenas o estilo de representação de Redmayne. A verdade é que a personagem de Jessica Chastain inscreve-se naquela linhagem de filme-denúncia, com Erin Brockovich à cabeça, mas veja-se como o filme de Steven Soderbergh é muito mais ruidoso. Não é que seja um estilo melhor ou pior, é apenas diferente. E, enquanto isso, O Enfermeiro da Noite é um McBcon bem mais apetitoso do que o documentário pop de Capturing the Killer Nurse.

Título: The Good Nurse
Realizador: Tobias Lindholm
Ano: 2022

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