| CRÍTICAS | Phil Spector

A única coisa capaz de rivalizar com a genialidade de Phil Spector é o seu mau feitio. Se por um lado é unânime a importância do seu contributo para a história da música pop anglo-saxónica (especialmente com a sua técnica do wall of sound, com a qual gravou todos os girls groups dos anos 60 que merecem ser ouvidos), por outro são conhecidos os relatos de violência doméstica da sua ex-mulher, Ronnie Spector, os seus desvarios com armas no estúdio (com John Lennon ou Leonard Cohen, por exemplo) ou a fama de mulherengo. Por isso, quando a aspirante a actriz Lana Clarkson apareceu morta na sua mansão, em 2009, ninguém se admirou nem sequer pôs a hipótese de ter sido suicídio ou acidente.

Este é um daqueles típicos casos em que não conseguimos distinguir entre o homem e a obra, acabando por utilizar os óculos julgadores que são distorcidos pela percepção que os media nos dão sobre determinada pessoa. Além disso, é possível admirar a obra de alguém cuja vida é censurável? É sobre isso que é Phil Spector, o telefilme da HBO baseado no caso que levou o produtor à barra do tribunal, em vez do biopic que os mais distraídos podem estar à espera (se bem que se recriam algumas entrevistas e até se ensaia, com liberdade dramática, o episódio com o John Lennon).

Este é um filme de David Mamet e, como tal, é um filme com muito palavreado. Mamet escreve diálogos como ninguém – o único que lhe dá luta é o Aaron Sorkin – e um filme de tribunal deixa-o como um peixe na água. Helen Mirren, como sempre brilhante, é a advogada de defesa que se depara com esta contradição de sentimentos e que tenta analisar o homem para lá da celebridade; e Al Pacino encontra em Phil Spector o veículo perfeito para o seu overacting, voltando a ter na televisão o seu melhor papel dos últimos dez (vinte?) anos (o outro é o de Jack Kevorkian, o Doutor Morte e rei da eutanásia nos Estados Unidos, ao qual deu vida em Ninguém Conhece Jack).

Está mais do que sabido que o verdadeiro se cinema se faz actualmente na televisão e os telefilmes da HBO (além dos dois que já referimos nestas linhas há ainda a mencionar Por Detrás do Candelabro) vieram ajudar a dar força a este facto. No entanto, apesar de Phil Spector não ter nada da má fama dos telefilmes, não deixa de faltar aqui uma certa escala cinematográfica e um arrojo maior. Ficou um golpe de asa curtinho, que poderia muito bem ter ido além do McChicken.

Título: Phil Spector
Realizador: David Mamet
Ano: 2013

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *