| CRÍTICAS | Eleições

Além de ser do caraças, O Rei dos Gazeteiros é um filme bastante particular. Primeiro, claro, porque é um dos derradeiros filmes sobre as dores de crescimento e a passagem para a idade adulta (afinal de contas, John Hughes filmou a juventude como ninguém, nos anos 80); e segundo, porque ressoa de forma clara em Eleições, como se este filme do Alexander Payne fosse o lado b de uma mixtape em que O Rei dos Gazeteiros é o lado a.

Enquanto que, em O Rei dos Gazeteiros, Matthew Broderick é um adolescente que se recusa a crescer, em Eleições ele é – com a mesma cara de gaiato de quem continua a teimar em se manter eternamente jovem – um jovem adulto que não está preparado para o que a vida tem para lhe oferecer. Ele é um professor de liceu, mas um dos poucos de que gosta realmente do que faz; e a perspectiva de ter que trabalhar de perto com a irritante da Reese Witherspoon – a jovem-prodígio que vai a todas e que colecciona todas as distinções da escola -, que concorre sozinha à liderança da associação de estudante, leva-o a apoiar Chris Klein, o desportista-modelo lá do sítio. O problema é que, por mais pequena que seja a pedrinha que coloca na engrenagem, o efeito-borboleta assegura-se que as consequências são devastadoras.

Alexander Payne começa aqui o seu périplo pela tragédia das vidas comuns e ordinárias, num filme que funciona quase como uma metáfora sobre o que de pior é despertado no ser humano quando cheira o poder ou sente os seus calos pisados. Há sátira e, clato, humor, mas este é negro e desconfortável, aquele risinho nervoso de quando não sabemos bem como reagir. É um jeu de mssacre mascarado de teen movie, que apesar do aspecto MTV (mas a MTV dos anos 90), nada tem a ver com American Pie – A Primeira Vez e respectivos quejandos (a comparação não é gratuita – esta comédia também sobre a passagem da adolescência para a idade adulta, mas com as hormonas aos saltos, é igualmente do mesmo ano e também tem o Chris Kline, que debutou em Eleições).

Eleições é também um percursor dos filmes de Wes Anderson, por exemplo, ou mesmo Noah Bambauch, para citar um dos nomes mais recentes da comédia adulta. Principalmente o primeiro, seja no uso inesperado da banda-sonora mais exótica (excelente uso do Navajo Joe, do Morricone, a April March ou o Donovan), ou nos grandes enquadrados das personagens. Foi com Eleições que Matthew Broderick deixou de vez de ser o eterno adolescente e foi com Eleições que Reese Witherspoon deixou de vez de só fazer papeis de adolescente e só isso é por si só significativo. Portanto, como não gostar deste McRoyal Deluxe, digam-me?

Título: Election
Realizador: Alexander Payne
Ano: 1999

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *