| CRÍTICAS | The Florida Project

Tangerine é um filme com mais méritos para ser recordado do que o simples facto de ter sido inteiramente filmado com iPhones. Consciente disso, Sam Baker não quis correr o risco de ficar eternamente ligado a esse fait-diver e decidiu fazer o mesmo filme, mas desta vez de forma tradicional, para provar aos mais cépticos que é mais do que um realizador com um truque.

The Florida Project é assim uma espécie de versão de Tangerine, mas com crianças em vez de transexuais. Moonee (Brooklynn Prince) e Scooty (Christopher Rivera) são dois amigos, aos quais se juntará Jancey (Valeria Cotto), em plenas férias de verão, altura da vida em que o tempo parece distender-se e a possibilidade de aventuras é quase infinita. As três crianças vivem num motel nas traseiras da Disneylandia, um lugar manhoso que se adequa melhor do que seria desejável aquelas famílias disfuncionais.

Tal como em Tangerine, The Florida Project passa-se numa espécie de lado b da América glamourosa e onde tudo é possível. Tangerine era ambientado em Los Angeles, teatro dos sonhos e casa das maiores estrelas de Hollywood, mas situava-se nos arrabaldes, junto às vidas reais que nada têm a ver com as estórias cor-de-rosa que enchem as páginas dos tablóides. E The Florida Project decorre num motel na parte de trás da Disneylandia, uma espécie de versão contrafeita desse parque que é, simultaneamente, sinónimo de diversão e felicidade. Além do cenário, há ainda outra semelhança entre ambos os filmes: o fascínio de Sam Baker pelos marginais. Em Tangerine era a comunidade transexual, os traficantes e um certo submundo do crime, enquanto que aqui são os rednecks, o white trash e todos aqueles que tentam vencer dia a dia.

The Florida Project é assim um conjunto de micro-histórias, especialmente ao redor de Moonee e da sua mãe (Bria Vinaite que, tal como Brooklyn Prince, é um achado), mas é Willem Dafoe, o gerente do motel, que funciona como pára-raios, atraindo para si toda a electricidade do filme e conferindo-lhe unidade. Dafoe é o manager frio e resposnável, que faz cumprir as regras, mas ao mesmo tempo empático e solidário, que é, tal como o próprio filme, uma espécie de figura de equilíbrio entre o certo e o errado.

Tanto temática quanto formalmente, The Florida Project não difere muito de Tangerine – a mesma câmara ao ombro, as cores garridas, a luz exposta quase até queimar… A diferença é que, aqui, Sam Baker está a trabalhar com crianças e estas conferem ao filme uma energia em estado puro que o deixam constantemente ligado à corrente. Por isso, quando chega o acto final, somos mais um parceiro daquela família informal, a viver no motel. E, por isso, o coração vai apertar eo McRoyal Deluxe vai enrolar-se na garganta, custando a engolir.Título:  The Florida Project
Realizador: Sam Baker
Ano: 2017

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