| CRÍTICAS | Voando Sobre um Ninho de Cucos

Há uma teoria que defende que os malucos é que podem estar certos e nós, aparentemente os sãos e normais, é que estaremos todos errados e a viver num mundo de ilusão. A ser verdade, todo o mundo como o conhecemos seria invertido. E é sobre isto que Voando Sobre um Ninho de Cucos se propõe a reflectir. Além disso, o filme, feito nos anos 70, era um alerta social sobre o que se passava nos hospícios do chamado mundo civilizado, uma realidade muitas vezes escondida, que chegava a ser perturbadora e cruel.

É por isso que o hospício de Voando Sobre um Ninho de Cucos, para onde Jack Nicholson é mandado, parece-se mais com uma prisão do que com um hospital. Todo o filme é filmado no interior daquelas paredes, herméticas e sob vigilância apertada constante (com excepção de uma pequena escapadela dos pacientes para irem a uma pescaria, numa cena que Milos Forman, inicialmente, nem queria utilizar), aumentando o sentimento de claustrofobia e de isolamento. Há filmes de prisão que respiram mais liberdade que este…

Jack Nicholson vai então parar a um hospício onde estão uma série de malucos, entre eles um debutante Christopher Lloyd, um Danny DeVito ainda com cabelo, Vincent Schiavelli com umas olheiras todo o tamanho, o então desconhecido Brad Dourif e um índio enorme surdo-mudo (Mel Lambert). O objectivo é Nicholson ser avaliado para que se perceba se ele tem alguma desordem psicológica ou se é apenas um preguiçoso com mau-feitio, que está sempre a ser preso.

 

Este é daqueles papéis que parece ter sido feito à medida de Nicholson, onde pode dar liberdade a todo o seu ar demente, lunático e psicótico. A par deste só mesmo a sua encarnação de Joker, o mais niilista dos personagens niilistas da história do niilismo. Nicholson vai então integrar-se naquela comunidade muito própria e o seu comportamento rebelde vai fazer com que os doidos comecem a pensar pelas suas próprias cabeças e questionem todas aquelas regras. E, de repente, os papéis são invertidos: os doidos são as vítimas e os sãos os malucos autênticos. No fim, tudo descamba num daqueles finais à Clube dos Poetas Mortos, com suicídios injustos, fugas desesperadas, castigos cruéis e, claro, muita lágrima derramada.

Aparentemente, Voando Sobre um Ninho de Cucos nem tem argumento. Limita-se a ser uma sequência de episódios mundanos no quotidiano daqueles pacientes, com as suas psicoses e maluquices. Mas quando damos por nós estamos tão integrados com aquela gente que começamos a sentir na pele as mesmas injustiças que eles. E, de repente, estamos a insurgir-nos em voz alta contra aqueles arrogantes e com o rei na barriga e a revoltar-nos contra tudo aquilo, ameaçando partir qualquer coisa que esteja mais à mão.

Voando Sobre um Ninho de Cucos é um dos grandes filmes da história da sétima arte e um dos poucos a vencer o grand slam dos Oscares: melhor filme, melhor argumento, melhor actor, melhor actriz e melhor realizador. Não é que isto seja um selo de qualidade inequívoco, eu sei que um Le Big Mac dos meus vale muito mais que isto. Mas já dá para ter uma ideia, não é?

Título: One Flew Over the Cukoo’s Nest
Realizador: Milos Forman
Ano: 1975

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