| CRÍTICAS | Por Favor Não Me Morda o Pescoço

Quando era puto, havia dois filmes que davam regularmente na televisão e que eu sempre me recusei a ver, graças aquele sistema de avaliação infalível que era filmes com títulos estúpidos são filmes estúpidos. O primeiro dava todos os Natais e o meu pai obrigava-me sempre a gravar, mas eu nunca o fazia; era O Bom, o Mau e o Vilão. E o segundo era Por Favor Não Me Morda o Pescoço. Claro que depois, anos mais tarde, acabei mesmo por ver o clássico de Sergio Leone e caiu-me tudo ao chão. E antes de ir ver o resto da trilogia dos dólares, fui logo buscar Por Favor Não Me Morda O Pescoço, aprendendo da pior maneira que you can’t judge a book by its cover.

Claro que na altura não fazia ideia quem era Roman Polanski, o mestre polaco que, em 1967, mostrou ao mundo que havia vida para os filmes de vampiros para lá das produções mumificadas da Hammer. Crises à parte, a classe vampiresca necessitava hoje de um filme como este, para que os filmes de vampiros não fiquem de futuro associados a boiolice.

Uma das coisas que pode afastar o espectador de Por Favor Não Me Morda O Pescoço é o seu humor, já que pode parecer que o filme não se leva a sério. No entanto, Polanski recorre ao burlesco e ao absurdo apenas para dar um toque muito próprio a um dos melhores filmes de vampiros da história do cinema de vampiros. Um dos seus principais trunfos tem a ver logo com a atmosfera criada. Apesar de muitas outras obras do género se passarem também na Transilvânia, nenhuma transmite o mesmo grau de isolamento de Por Favor Não Me Morda O Pescoço, com Polanski a captar na perfeição o ambiente dos Balcãs pré-Kusturica.

A partir daí – do momento em que o professor Abronsius e o seu ajudante (Jack MacGowran e o próprio Polanski, respectivamente) – chegam à Transilvânia, para descobrirem o conde Krolock (Iain Quarrier), é o desfilar de códigos e sinais de vampiragem, desde os mais conhecidos – o alho, os crucifixos, os caninos – aos que acabaram por se fixar e formar norma. E tudo culmina no ponto alto do filme: infiltrados num baile de vampiros, filmado com graciosidade e protocolo barroco, os heróis são descobertos ao serem os únicos reflectidos no enorme espelho do salão. A cena é tão marcante que, ela própria, deu origem a uma versão musical do filme, composta pelo mesmo Polanski, na Áustria, em 1997.

Por Favor Não Me Morda O Pescoço tem ainda o interesse mórbido de ser o filme em que Roman Polanski conheceu Sharon Tate, que viria a ser sua esposa e, depois, assassinada cruelmente pela Família, de Charles Manson. Tate é um raio de luz que atravessa as sombras, a neve e o claro-escuro de todo o filme, não propriamente pelas suas qualidades de representação (até porque o filme não lhe exige grande esforço), mas sobretudo pelo seu longo cabelo escarlate e fotogenia. Por Favor Não Me Morda O Pescoço é um saboroso McBacon, acompanhado pelas respectivas doses de sangue para apurar o paladar.

Título: The Fearless Vampire Killers
Realizador: Roman Polanski
Ano: 1967

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