| CRÍTICAS | Correio de Droga

Clint Eastwood continua a enganar a reforma e, em Correio de Droga, não só volta a realizar mais um filme, como regressa também à representação. A continuar assim, muito em breve quebrará o recorde de Manoel de Oliveira.

Correio de Droga é um primo de Gran Torino, o último grande filme de Clint Eastwood (se bem que, entretanto, também houve Sully e Jersey Boys, que são simpáticos) e isso talvez tenha contribuído para um pequeno boost de popularidade. Tem o mesmo argumentista (Nick Schenk), o mesmo ambiente (os subúrbios do sul dos Estados Unidos) e Clint Eastwood a fazer o mesmo papel – o último dos full americans, personificação de um certo ideal republicano, se bem que aqui em versão mais tolerante do que em Gran Torino. Até há uma cena bastante tongue in cheek, com Clint a ajudar um casal de “negros” a mudar um pneu. We don’t use that word anymore, sir.

Com 88 anos e um negócio de floricultor que faliu, Clint aproveita o seu longo historial nas estradas americanas sem uma única multa para se tornar num correio de droga para o cartel mexicano de Andy Garcia (que agora faz o sempre o mesmo papel, em que só muda se tem barba ou não). Como os agentes especiais Bradley Cooper e Michael Peña não estão à espera de um velhote branco, ele consegue ir passando por entre os pingos da chuva, num percurso até à redenção final, onde vai expiar os seus pecados passados de mau pai e mau marido.

A ideia é boa e já o vimos a fazer o mesmo antes, de Um Mundo Perfeito a Imperdoável. O problema é que este argumento é claramente curto e parece ter sido terminado à pressa. As personagens secundárias ou são figuras unidimensionais de papelão (a família, com o desperdício de ter Dianne Wiest e não a aproveitar) ou arquétipos (Andy Garcia, especialmente, e todos os bandidos mexicanos de bigodinho e tatuagens), os polícias não têm sequer um caso sólido (um informador que é o único que faz a trama avançar) e até a figura do polícia – que é uma espécie de o outro lado da mesma moeda, na sua obstinação pela obrigação profissional, que o levam a colocar em segundo plano as obrigações familiares – não passa de uma simples ideia por concretizar.

Claro que depois há… Clint Eastwood. Não o Clint Eastwood realizador ou actor (sem desprimor para estes, antes pelo contrário), mas o Clint Eastwood pessoa, cuja presença faz toda a diferença. Assim como Robert Redford em O Cavaleiro com Arma, também aqui a figura de Clint tem um outro peso e significado, tanto para o filme como para o próprio cinema. E, assim, Correio de Droga é resgatado da mediania confrangedora para um simpático(?) Double Cheeseburger.

Título: The Mule
Realizador: Clint Eastwood
Ano: 2018

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