De tempos a tempos lá vem um filme como este, que nos lembra que, para haver bom cinema, basta uma boa história, um actor e um local. Em Enterrado bastava ter o Ryan Reynolds dentro de um caixão debaixo da terra; em Cabine Telefónica era só pôr o Colin Ferrell numa… cabine telefónica(!); e em Locke era só o Tom Hardy a conduzir.
O Culpado, candidato dinamarquês ao Oscar que se ficou pela shortlist final, segue esta tradição. Um polícia a atender chamadas de emergência do 112 em Copenhaga e um telefonema de uma mulher, raptada pelo marido. É, portanto, um primo de Locke, que apesar de estar encerrado no mesmo local, utiliza o telefone para se projectar em outras personagens e localizações.
É, portanto, um filme de argumentista. Extremamente bem escrito, O Culpado começa por dar-nos pequenas pistas, que nunca são demasiado descritivas, que servem para tirarmos a pinta aquele agente. Asger (Jakob Cedergren) está ali a atender telefones porque é uma espécie de castigo, já que parece que fez alguma coisa que não devia e está a braços com um processo disciplinar. O seu carácter também é questionável, tanto pela forma como julga as pessoas que fazem as chamadas de emergência que recebe. Ou será que tem a ver com o divórcio recente? E, de repente, uma tal de Iben liga e consegue dizer que está a ser levada pelo marido…
Se o argumento de Emil Nygaard Albertsen é impecável na forma como vai manipulando o suspense e destapando a trama aos poucos e poucos, conseguindo manter sempre o interesse e o foco apesar da limitação de meios – uma sala de onde não se sai, um actor e um telefone -, o realizador Gustav Möller sabe ilustrar tudo isto com uma realização tensa e habilidosa, que prova pela enésima vez que a sugestão é muito mais poderosa do que mostrar tudo. E, no final, ainda sacam da cartola um twist que nos acerta em cheio no estômago.
O Culpado é um filme curtinho, que se desenrola com uma intensidade que nos deixa, no final, nervosos e perturbados. E não julga ninguém, porque o culpado do título não é só o marido raptor ou o polícia com um comportamento por vezes censurável. São todos os envolvidos, incluindo quem está sentado do outro lado do ecrã. Os únicos inocentes nesta equação somos nós, que somos adoráveis e que damos Le Big Macs a filmes que realmente fazem a diferença.
Título: Den Skyldige
Realizador: Gustav Möller
Ano: 2018