| CRÍTICAS | Emboscada Final

A ideia por trás de Emboscada Final é genial. Pegar numa história já contada em filme (e num belo filme é Bonnie e Clyde) e refazê-lo sobre o ponto de vista de outras personagens (neste caso a dos polícias que os capturara) faz com que a mesma história tenha dois filmes bem distintos entre si, provando que a História depende sempre da perspectiva de quem a conta. Que bom era que Emboscada Final fizesse escola e criasse um estilo.

Além disso, Emboscada Final tem ainda uma enorme carga simbólica associada. Enquanto que Bonnie e Clyde inaugurava uma nova era em Hollywood, com os movie brats a simbolizarem na perfeição a rebeldia daquele casal de foras-da-lei que apaixonaram o público, Emboscada Final é um filme sobre um tempo (e um cinema, já agora) de outrora, que está a terminar. É mais ou menos como Correio de Droga ou O Cavaleiro com Arma. Aliás, tivesse o filme sido feito com Paul Newman e Robert Redford como estava inicialmente planeado e essa carga simbólica seria ainda mais especial.

Bonnie e Clyde foram então um casal de malfeitores e assassinos que andaram foragidos durante dois anos, até serem fuzilados por um bailado de balas naquela cena icónica no final do filme de 1958 e que é o início oficial da Nova Hollywood. Para os capturar foi preciso ir buscar à reforma dois rangers do Texas (Kevin Costner e Woody Harrelson), dois homens do antigamente (aqui reforçado a traço grosso constantemente, não fossemos nós não perceber a dica à partida, seja com Woody Harrelson fascinado de 20 em 20 minutos com as escutas telefónicas ou com Kevin Costner com as metralhadoras), com métodos tão antiquados quão eficientes.

Emboscada Final é então um thriller crepuscular, que se esforça tanto em replicar essas ideias que até se esquece às vezes de contar a sua própria história. Ou seja, acontece amiúde que a investigação policia se limita a avançar apenas devido a coincidências. E, obviamente, quando estas são em demasia, a suspensão da descrença torna-se mais difícil.

Mas o que realmente incomoda no filme é o facto de que o realizador John Lee Hancock, depois de um filme inteiro em que nunca mostra a cara de Bonnie e Clyde (são apenas fantasmas onde podemos projectar a nossa memória de Warren Beatty e Faye Dunaway), sucumbe à tentação na última cena e revela-nos as suas faces. Com isso perdemos a ligação com Bonnie e Clyde, que é o que mais gostamos em todo o filme. No entanto, a premissa excelente e os dois actores que levam o filme às costas (e que estão no ponto caramelo das suas carreiras – quem diria que Costner iria envelhecer tão bem?) fazem toda a diferença, dando a Emboscada Final um McBacon ligeiramente acima da mediania.

Título: The Highwaymen
Realizador: John Lee Hancock
Ano: 2019

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