| CRÍTICAS | Sexo, Mentiras e Vídeo

Em 1989, Steven Soderbergh apresentava-se ao mundo cinéfilo e fazia furor em Cannes, levando para casa a Palma d’Ouro. Para o em e para o mal, uma vez que, ainda hoje, muito boa gente continua sem perdoar o júri presidido por Wim Wenders por não ter dado o prémio a Não Dês Bronca. Spike Lee incluíido, claro.

O que é certo é que Sexo, Mentiras e Vídeo é sinal de um tempo e de um cinema que fez escola, mas que já não existe. Era o verdadeiro cinema independente, que trazia o art movie para as ruas, arrastando-o pelos cabelos para fora da escola de cinema, abordando temas pessoais sem qualquer concessão artística. Curiosamente, Spike Lee – e Kevin Smith, por exemplo, com o seu Clerks – também fizeram parte deste movimento.

Sexo, Mentiras e Vídeo é a história de quatro jovens adultos e da sua vida sexual. Andie MacDowell e Peter Gallagher são casados, mas enquanto a primeira considera o sexo sobrevalorizado e anda a fazer terapia para se deixar de sentir retraída ao toque do marido, este anda a trai-la à bruta com a maluca da irmã (Laura San Giacomo). O equilíbrio deste triângulo vai ser abalado quando surge em cena James Spader mais a sua câmara de filmar. É que este, impotente, usa o vídeo para filmar entrevistas sexuais com mulheres, excitando-se e fazendo verdadeira terapia com elas.

A câmara de filmar – e, consequentemente, o cinema – ganha assim uma segunda leitura, muito mais simbólica. É uma espécie de elemento distanciador, um filtro entre quuem está à frente e atrás da câmara. Não deixa de ser irónico o paralelismo, mas inverso, com A Vítima do Medo, onde a câmara era um instrumento de aproximação e destruição. São vários os paralelismos entre o filme de Soderbergh e esse clássico de Michael Powell, até no estilo.

Sendo um filme palavroso, feito sobretudo da palavra, Soderbergh procura imprimir-lhe ritmo na forma como filma os diálogos, sempre com a câmara em movimento. E depois dá espaço aos seus actores para brilharem, com destaque para James Spader, sempre com a mesma tensão sexual ambígua de um jovem Marlon Brando. E por falar em jovem Brando, Tennessee Williams teria gostado muito de Sexo, Mentiras e Vídeo, com toda a sua sexualidade reprimida.

Sexo, Mentiras e Vídeo é assim um objecto singular, até na filmografia (muito eclética e diversa) de Steven Soderbergh. E merece por inteiro o seu lugar particular na história da sétima arte, mesmo com as suas limitações de McBacon.

Título: Sex, Lies and Videotape
Realizador: Steven Soderbergh
Ano: 1989

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