| CRÍTICAS | Foxtrot

Israel é um país fucked up. Aquele que devia ser o Estado da Paz, está em permanente estado de guerra e todos os jovens – judeus, duros, beduínos… -, assim que atingem a maioridade, têm que servir o país. Por três anos(!). E, mesmo assim, quando sabem ainda ficam na reserva, com a obrigação de puderem ser chamados por 30 dias por ano. Isso faz parte do ADN deles e dos desígnios divinos do Estado de Israel e isso é completamente fucked up.

Por isso, o momento mais cruel para qualquer pai israelita é receber a visita em casa de algum soldado. Porque isso significa que algo aconteceu ao seu filho. É precisamente assim que começa Foxtrot: uma campainha, um dedo a pressiona-la, uma mãe a abrir a porta e automaticamente a desmaiar assim que vê as fardas. Logo a seguir vem toda uma indústria de morte, completamente normalizada: um rabi militar que trata dos pormenores todos e uma equipa completa que evita que os pais não tenham que fazer nada acerca do funeral. Como é que isso pode ser o normal?

É assim a primeira parte de Foxtrot, filme dividido em três actos bem definidos, como uma tragédia grega. E é também o momento mais chocante e mais brutal. O realizador Samuel Maoz, que não é bem visto em Israel porque mete o dedo na ferida e fala destas coisas de forma crítica, em vez de o aceitar como Deus quer que seja, está sempre a explorar novas formas de colocar a câmara e filmar aquele pai (Lior Ashkenazi) – que ainda por cima é ateu – perante a perda, a dor e o absurdo da guerra.

Depois vem o segundo acto e somos deslocados para um posto rodoviário no meio do nada: há uma estrada, uma cancela, um contentor e quatro soldados em permanência, no meio do deserto, onde são mais os camelos do que os carros. Um desses soldados é Jonathan (Yonaton Shiray), de quem ouvimos falar anteriormente.

O tom e a forma deste segundo momento são completamente diferentes do primeiro. E aqui a tónica é colocada no absurdo da guerra: quatro jovens em absoluto processo de desumanização, isolados do nada, às ordens de um qualquer dispositivo invisível. Nos momentos mais surrealistas, Maoz quase que parece um Kusturica (o de Arizona), com as danças malucas, o pavilhão que se afunda todos os dias um bocadinho e as pessoas bizarras que, de quando em vez, lá passam por aquele controle rodoviário.

Ainda haverá um terceiro – e último acto – em Foxtrot e regressamos a casa de Jonathan, se bem que desta vez o filme se prende na mãe (Sarah Adler). É um momento mais de descontração e descompressão, mas também é a parte menos interessante das três. As outras duas são ambas incríveis, sendo a segunda a melhor provavelmente, se bem que depois há o problema final: todas juntas não colam assim tão bem quanto queríamos. Talvez o McBacon fosse diferente se as coisas fossem postas de outra forma.

Título: Foxtrot
Realizador: Samuel Maoz
Ano: 2017

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