| CRÍTICAS | Wounds

Todos nós vimos Uma Chamada Perdida para saber que telemóveis podem ser uma coisa assustadora. Wounds segue esse princípio e é um autêntico mindfuck movie. No entanto, não o é pelos motivos certos. É que esta nova produção Netflix faz lembrar aqueles tempos ainda sem televisão por cabo que, quando estava a chover, o canal 1 sobrepunha-se ao canal 2 e víamos dois programas ao mesmo tempo.

Will (Armie Hammer) é o ponto de contacto entre estes dois filmes que se cruzam, mas que não se misturam. Will mantém um emprego da treta atrás do balcão dum bar cheio de bêbados e tipos à procura de encrenca, mas mantém uma certa superioridade moral porque tem um canudo. Está na gaveta, mas serve-lhe desculpa moral para continuar a prolongar aquela vida sem futuro. Em casa, tem a namorada, Dakota Johnson, que está a escrever a tese, mas de quem ele gosta mesmo é de Alicia (Zazie Beetz), uma cliente lá do bar que parece trocar de namorado como quem gosta de camisa e que, aparentemente, um deles foi o próprio Will.

Certa noite, uns putos deixam lá um telemóvel esquecido e quando Will o leva para casa, começa a receber umas mensagens estranhas. A partir daí, instala-se o caos, tanto na sua vida como na nossa cabeça. É que nada faz sentido. Vemos uns vídeos sobre uns rituais, mas nunca sabemos o que são; vemos umas fotos de pessoas mortas, mas nunca descobrimos o que se passou; Will começa a ser seguido, mas não sabemos por quem; sabemos que tudo isto está relacionado com… feridas(!), porque é esse o título do filme (e há um bêbado lá do bar que leva uma chinada na cara); e há baratas, muitas baratas, sabe lá deus porquê.

O realizador Babak Anvari está mais interessado em levantar questões do que a dar respostas, mas convém dar algumas pistas, caso não queira alienar o espectador por completo. É certo que há ali qualquer coisa de Twin Peaks, naquela normalidade aparente de subúrbio, mas não é David Lynch quem quer. Há também uns pós de body horror, com as tais feridas e tal, mas também só é Cronenberg quem pode.

Wounds até é um drama competente, sobre um homem dividido entre a relação estável em casa (mas em falência) e a relação incerta (e mais idealizada do que outra coisa) com a tipo do bar, mas não é esse o caminho de Wounds. E depois termina tudo com uma grande diarreia mental, que só serve para complicar ainda mais as coisas. Pergunta a tagline do filme: how deep do they go? Responde a gente: you’re so deep we can’t even see you. A Hamburga de Choco está para este filme assim como o ananás está para a pizza.

Título: Wounds
Realizador: Babak Anvari
Ano: 2019

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