| CRÍTICAS | Parasitas

Olhamos para a sinopse do primeiro filme de Bong Joon Ho e para a deste último, Parasitas, e quase que somos levados a pensar que não estamos a falar do mesmo realizador, de tão diferentes que são. Nesse já longínquo The Host – A Criatura havia um monstro que emergia em Seoul e começava a matar pessoas; neste Parasitas, há uma família de pobretanas que arranja uma série de esquemas para ir trabalhar para uns ricaços. E, no entanto, ambos os filmes são praticamente iguais, como se fossem os dois lado da mesma moeda. Devíamos ter adivinhado pela semelhança dos títulos…

Em Parasitas há então duas famílias. A primeira vive na parte pobre de Seoul, numa cave minúscula que alaga sempre que chove mais e onde os bêbados vão fazer xixi à janela, e vivem de biscates e trabalhos precários; a segunda vive numa mansão assinada por um arquitecto famoso com um jardim imenso, têm empregada e motorista privado e não sabem o que fazer a tanto dinheiro. Quase por acaso, os destinos destas duas famílias vão-se cruzar e os primeiros vão engendrar um plano para a acabarem todos a trabalhar lá em casa dos ricaços. E, por momentos, Parasitas é uma versão de Shoplifters – Uma Família de Pequenos Ladrões, mas em pior.

Mas se há algo que Bong Joon Ho nos habituou nos seus filmes é que ele não é um homem de se ficar por um estilo só. O realizador coreano gosta de misturar géneros e, por vezes, até os menos prováveis (lembram-se do filme de monstros que era apenas um dispositivo para falar de coisas mais sérias?). Por isso, a meio de Parasitas, abre a primeira caixa de pandora (ainda haverá de abrir mais uma ou duas). Talvez influenciado por Ulrich Siedl, surge naquela casa uma cave secreta e tudo se altera, incluindo o papel da própria mansão, que está para o filme assim como a casa de O Meu Tio está para o senhor Hulot.

De repente, Parasitas começa a ganhar peso e gravidade. E, tal como The Host – A Criatura, também este serve para falar da diferença de classes, do 1 por cento versus os 99 por cento, dos privilegiados e de todos os outros… Parasitas é uma sequela de The Host – A Criatura, mas de forma improvável, que passa pelo humor, pelo melodrama e até pelo thriller psicológico com um savoir faire que lhe permite socar-nos um par de vezes no estômago sem sequer reagirmos. E é isso o melhor deste McRoyal Deluxe, ou seja, a forma como se instala em nós (da mesma forma que aquela família se instala na vida dos ricos sem eles perceberem) e nos abre os olhos para o que se passa lá fora e que teimamos em ignorar.

Título: Gisaengchung
Realizador: Bong Joon Ho
Ano: 2019

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