| CRÍTICAS | Knives Out – Todos São Suspeitos

Não é fácil proclamar a morte de um género cinematográfico, até porque eles estão sempre a voltar e a reinventarem-se (olhem o western, já dado como morto mil e uma vezes, ou mesmo o musical), mas quase que punha as mãos no fogo que o whodunnit estava mais do que enterrado. Afinal de contas, a última vez que ouvimos falar dele foi em 2001, no Gosford Park, de Robert Altman. E, no entanto, estamos em 2019 e eis um novo whodunnit a aparecer na lista dos melhores do ano de muita gente respeitável.

Knives Out – Todos São Suspeitos nem tenta disfarçar, já que vai buscar todos os códigos do género. Numa enorme mansão de estilo vitoriano, um ricaço e bem-sucedido escritor de policiais (Cristopher Plummer) – estão a ver a ironia? – reúne a família para o seu 85º aniversário. Nessa notie, corta a garganta inesperadamente. No entanto, o que parecia um suicídio claro, acaba por começar a cheirar a esturro, até porque todos os membros da família – incluindo a enfermeira emigrante Marta (Ana de Armas) – tinham um motivo para se livrarem do velho (é o subtítulo da tradução em português a teimar em ser mais uma vez revelador a mais). Eis então que entra em cena o detective privado e mestre da dedução, Benoit Blanc (Daniel Craig), uma espécie de Hercule Poirot americano (apesar de ser um inglês a fazer de francês).

Não há muito a inventar no género do whodunnit, mas Rian Johnson está pronto para surpreender. Primeiro porque, pela primeira vez, o filme-coral não circula à volta da figura do detective (que aqui também não é propriamente infalível, como o é Poirot ou Sherlock Holmes), mas sim de um dos suspeitos: a enfermeira Marta. E depois porque, ainda antes de meio, Johnson revela logo o crime. Isso não quer dizer que os twists e os contra-twists do argumento não vão continuar a suceder até ao final, onde tudo se remata, colocando os pontos nos i e atando as pontas soltas (que vão ser muitas).

Rian Johnson faz uma espécie de versão-pop de um whodunnit, trocando o filme de prestígio britânico que normalmente associamos ao género pelo thriller estilizado de um Guy Ritchie ou outra versão genérica de Tarantino. Ele, que já tinha redefinido o filme de liceu ao cruza-lo com o noir em Brick (vénia com saída à rectaguarda), tem uma costela cinéfila que não renega, seja nas piscadelas de olho a Danica McKellar ou a Crime, Disse Ela, seja na cena final que tem Hitchcock escrito por todo o lado (apesar do trono de facas ser uma referência a outro trono…).

Com um leque de actores de primeira linha, Rian Johnson acaba por ter que tirar coelhos da cartola atrás de coelhos para manter a trama a carburar e o espectador em suspense. Para isso, tem de recorrer a uma espécie de gimmick (Ana de Armas não consegue mentir sem vomitar…) e a um sem-número de situações inverosímeis, que o tornam cada vez mais irrealista. Knives Out – Todos São Suspeitos entretém? Entretém sim senhor, com humor e mistério em doses qb. Mas vamos pô-lo na lista de melhores do ano? Nem de longe, daqui não leva mais do que um Double Cheeseburger. E nós até gostamos do whodunnit.

Título: Knvies Out
Realizador: Rian Johnson
Ano: 2019

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