| CRÍTICAS | A Busca

Steven Seagal vende o kung-fu da mesma forma que as pseudo-ciências vendem a acupunctura. Joga a cartada da falácia da antiguidade – uma cena mais antiga que o próprio tempo, dinamizada por mestres sábios de outrem – e depois ataca com a ideia de uma certa aura mística, que serve para tapar os buracos daquilo que não sabe explicar. E Seagal, com o seu historial de filmes de porrada e com a mania que sabe falar chinês, sente-se como um digno representante do kung-fu e da sua filosofia no ocidente.

A Busca é um projecto pessoal de Steven Seagal, que produziu, escreveu, estrelou e até era suposto realizar, sobre o kung-fu e sobre estas ideias místico-filosóficas. Seagal faz de um ex-soldado que se cansou de tanta morte e sangue nas mãos e que se mudou para Hong Kong, refugiando-se numa cidade onde dá umas consultas de quiropraxia. O problema é que essa mesma cidade é o berço da corrupção e do crime de Hong Kong e, por isso, mesmo que Seagal não queira, os foras-da-lei hão de ir ter com ele.

O problema de Steven Seagal não é ele acreditar nestas coisas todas. O problema é ele ter umas noções distorcidas do que é rectidão, justiça e nobreza. Por exemplo, há uma cena em A Busca em que o seu bff, Chen Man (o único no filme que consegue realmente lutar), repreende um cliente que maltratou uma empregada. Ele acusa-a de o ter roubado e Chen Man dá-lhe uma tareia descomunal. Depois vai perguntar à empregada e ela admite que roubou mesmo o homem. Não é propriamente uma cena muito inspiradora…

Steven Seagal perde-se nesta auto-adoração, medindo a sua pilinha sempre que pode, e isso inclui pôr em fast forward todas as cenas de porrada em que entra. Alguém devia fazer uma intervenção. Seagal está em negação e não aceita que está gordo e velho (e conta que tem um joelho todo lixado), por isso as suas cenas de porrada são agora ele muito quieto e a mexer as mãos muito depressa.

Com tanta bajulação, quase que passa despercebido o subplot em que um criminoso local , que alguém explica ter uma doença que não o deixa apanhar sol, rapta uma chinesa que tem poderes místicos(!), com o objectivo de a prender para sempre na sua casa(!!). É o próprio que o refere, duas vezes. Só nunca se lembram é de explicar porque o faz. Yada yada yada, pardais ao ninho e lá vai Steven Seagal ver-se obrigado a reactivar a sua equipa para-militar, cheio de gajos com comportamos dúbios (outra vez, os double standards de Seagal.)

Assim, a partir de meio, A Busca deixa de ser um o filme místico de kung fu, cheio de tiradas existencialistas, e transforma-se no enésimo filme de tiros que Seagal faz agora às carradas desde que se especializou no straight-to-video. No final, tem que derrotar o mauzão com as mãos, claro, porque ele auto-intitula-se um mestre do kung fu e recusa-se a utilizar armas(!). A Busca caminha assim entre o risível e o absurdo, contribuindo decisivamente para dar razão a artigos como este. Mesmo assim, vale um Happy Meal pela mudança de ares na filmografia recente de Seagal e por uma cena de tortura logo a abrir, de trás para a frente.

Título: Attrition
Realizador: Mathieu Weschler
Ano: 2018

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