| CRÍTICAS | Perfect Blue

Darren Aronosfky tem uma espécie de obsessão por Perfect Blue. Depois de ter adquirido os direitos do filme de Satoshi Kon para poder usar a já famosa cena da banheira no seu A Vida Não é um Sonho, foi inevitável não reparar nas semelhanças entre este e o seu Cisne Negro. Ou seja, ambos são filmes sobre artistas perturbadas e pressionadas sexual e profissionalmente. E ambos flirtam com a temática do doppelgänger.

Por isso, mesmo para quem não seja particular apreciador de anime (eu incluido), Perfect Blue é um filme obrigatório. Até porque Satoshi Kon é um dos mestres do storytelling sem recorrer a palavras. Basta ver como Perfect Blue recorre à teoria das cores e utiliza o… vermelho (aha, pensavam que era o azul, não era?) da mesma forma que Kieslowski na sua trilogia das cores.

Mima (voz de Junko Iwao) é então uma cantora de uma girls band que – mais por pressão dos agentes do que sua (e isso inclui a manager, Rumi (voz de Rica Matsumoto), que teima em viver os seus antigos sonhos de ídolo pop através de Mima) – decide trocar os palcos pela representação. De repente, a pressão passa a ser muita: a responsabilidade de ter que provar que é mais do que uma fútil cantora de plástico; um stalker que anda a documentar a sua vida na net; a pressão dos produtores da novela e dos seus representantes; e tudo isto no isolamento social do Japão contemporâneo, que em 1997, ou seja, pré-democratização da internet, já era uma ameaça forte.

Kon não necessita de muitas palavras para ir cozinhando Perfect Blue em lume brando, à medida que vai aumentando a paranóia de Mima, até ao ponto em que já não sabemos o que é real e o que não é. O momento-charneira é uma traumatizante cena de violação na novela em que está a filmar, que depois há de rimar com os momentos mais gráficos do filme: um par de esfaqueamentos e um atropelamento, com as habituais explosões de sangue que marcam todo o cinema japonês, Kurosawa incluido.

Perfect Blue é um filme inteligente, um thriller psicológico mindfuck que abriu muitas portas ao género no ocidente. Aliás, depois de deixar Aronofsky obcecado, o realizador Satoshi Kon também mexeu com Cristopher Nolan, que pilhou meio-Paprika para o seu A Origem. Só por isso já vale a pena ver este McRoyal Deluxe. Mesmo que não sejam apreciadores de anime, repito.

Título: Pâfekuto Burû
Realizador: Satoshi Kon
Ano: 1997

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