| CRÍTICAS | What’s Love Got to Do with It

É difícil encontrar um duo mais irónico na música do que Ike e Tina Turner. Durante cerca de duas décadas conciliaram os palcos com a vida doméstica, arrasando ao vivo e vendendo discos como pãezinhos quentes, garantindo um lugar no Olimpo do rock’n’roll. E, sem sabermos, Tina Turner era abusada em casa por um Ike violento e ciumento, de quem se conseguiu emancipar em 1978. E no biopic What’s Love Got to Do with It, baseado na biografia de Tina, o realizador Brian Gibson explicou que não pôde mostrar muitas das coisas que realmente aconteceram longe dos holofotes porque ninguém iria acreditar que seria verdade(!).

What’s Love Got to Do With It é o biopic de Ike e Tina Turner pelo ponto de vista da segunda, focando-se na sua vida e obra. No entanto, fa-lo apenas a partir do momento em que Tina deixou Nutbush, Tennessee, para St. Louis, e conheceu Ike Turner, quando ele era ainda o líder dos Kings of Rhytmn. Toda a sua vida anterior a isso fica resumida a um prólogo antes dos créditos iniciais, com uma pequena Tina Turner a arrasar no coro da igreja.

É então a habitual saga da ascensão e queda, com as drogas pelo meio, menções veladas a traições e, claro, muita violência doméstica. Ike Turner, cego pela droga e pelo ciúme de ver a sua mulher captar todos os holofotes da fama, quando ele cria que ele é que os merecia, tornam-no num wife beater abusador que ultrapassa todos os limites, mas que Tina Turner aguentava e calava, sem que isso afectasse as suas prestações em palco. Até ao dia em que se encheu de força e, com a cara num oito, 36 cêntimos e um cartão de crédito no bolso, foi pedir um quarto no hotel em frente para nunca mais regressar. A partir daí era a emancipação de Tina Turner e o filme termina com o seu comeback, a solo, a abraçar em pleno os anos 80 com hits como… What’s Love Got to Do With It.

O principal problema do filme é a gestão de tempo. What’s Love Got to Do With It vai dando saltos maiores que a perna e, por vezes, ficamos sem saber o que se passou nos intervalos. Isso faz com que as personagens – especialmente Ike – não tenham propriamente espessura para lá daquela que já conhecemos. É certo que Angela Bassett faz um papelão, especialmente nas actuações (apesar da própria Tina Turner fazer o lipsync), mas Laurence Fishburne cai rapidamente num registo canastrão, do qual não é fácil sair usando todos aqueles fatos de chulo.

Falta a What’s Love Got to Do It mais filme. Falta-lhe mais profundidade e mais contexto para enquadrar o sucesso da dupla e toda a violência inerente. Mas depois vem a música, toda ela incrível, que embrulha tudo isto de forma empolgante e lhe dá um lado icónico. E, perante isso, é impossível não gostar do filme. Se bem que preferíamos algo mais substancial do que o Cheeseburger.

Título: What’s Love Got to Do with It
Realizador: Brian Gibson
Ano: 1993

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