| CRÍTICAS | Verão de 85

François Ozon queria usar o In Between Days, dos Cure, no seu novo filme, chamado Verão de 84, e telefonou a Robert Smith para ver se ele lhe baixava o preço dos direitos. Smith disse que sim senhor, mas que Ozon teria que alterar o título para Verão de 85, uma vez que a música tinha sido lançada em 1985. Este aceitou e todos saíram satisfeitos: o realizador, o músico e todos os obsessivos compulsivos que sofrem com o anacronismo no cinema.

Verão de 85 é assim um conto de verão coming of age (e até partilha com o Conto de Verão homónimo de Rohmer, um clássico nesta temática, Melvil Poupaud – aqui na pele de um professor de Literatura), uma daquelas histórias de amor num período em que tudo é exageradamente exagerado. Tanto os amores parecem ser para a vida, como os desgostos de caixão à cova. E, no entanto, depois do fim do verão, tudo regressa à normalidade…

Alexis (Félix Lefebvre) e David (Benjamin Voisin) conhecem-se quando o primeiro está quase a afogar-se e vão-se tornar inseparáveis. Pelo menos, até um pauzinho entrar na engrenagem (que aqui é Kate (Philippine Velge), uma au pair inglesa que vai entrando e saindo da história a gosto do realizador) e fazer colapsar aquelas seis semanas de idílio num lugarejo balnear francês. Pela natureza homossexual da história não há como fugir às comparações com Chama-me pelo teu Nome. Mas em mau.

De facto, esta é uma abordagem muito frouxa de Ozon, que confia em demasia no hedonismo dos seus personagens. Nem sequer há um bocadinho de poesia para dar espírito à trama, como costuma acontecer nestes casos, já que Verlaine é apenas abordado num diálogo de passagem (e os Cure, tanta coisa com a história dos direitos da canção, e afinal só aparecem nos genéricos de abertura e de fecho). E, tendo em conta, que há um professor de Literatura, esperava-se um bocadinho mais de Espírito.

Depois, Verão de 85 termina demasiado cedo e demora-se num prólogo tão aborrecido, quanto fraco. Não há força dramática da mesma forma que não há provocação ou transgressão. Nunca sentimos aquele peso da Juventude e dos sentimentos exacerbados, assim como nunca sentimos vontade de ir dançar na tumba de Benjamin Voisin, como era o seu desejo. E é essa a verdadeira força motriz de Verão de 85. Já diz a sabedoria popular: Cheeseburger não puxa carroça.

Título: Été 85
Realizador: François Ozon
Ano: 2020

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