Quando surgiu, Borat apanhou toda a gente desprevenida. Era tão chocante e provocador que até parecia ser too much. Depois a distância temporal foi permitindo olhar para ele melhor, enquanto Sacha Baron Cohen continuou por aí sempre do lado certo da barricada, fazendo então com que fosse ganhando um espaço especial no nosso coração.
E eis que, de forma inesperada, surge uma sequela a Borat em 2020, um ano em que tudo parece ruir. A extrema-direita continua a ganhar cada vez mais espaço, líderes com tiques dictadoriais continuam a ser eleitos no primeiro mundo, direitos que estavam conquistados há muito retrocedem quase diariamente e a democracia está mais ameaçada que nunca. Por isso, Borat, o Filme Seguinte podia ser o sinal que precisávamos e vir dar trazer-nos alguma fé renovada na humanidade.
Borat, o Filme Seguinte segue a fórmula do primeiro. Borat (Sacha Borat Cohen) é o jornalista número 1 do Cazaquistão (que voltou a não gostar de ser retratado como uma país periférico de terceiro mundo) que é mandado de volta aos Estados Unidos, desta vez para entregar uma prenda a Mike Pence, vice-presidente, e voltar a ganhar as boas graças do mundo. Só que uma volta inesperada dos acontecimentos faz com que Borat viaje com a sua filha (a búlgara Maria Bakalova, que ganha aqui um bilhete para Hollywood), que vai acabar por ser o presente para Pence.
O filme é, basicamente, uma sucessão de apanhados, que depois são cozidos com meia-dúzia de cenas que ajudam a criar uma linha narrativa. Contudo, o argumento é algo que não interessa para nada aqui. O que toda a gente quer ver são as situações provocadoras, mas pertinentes, que Sacha Baron Cohen e Maria Bakalova criam, colocando o dedo bem no centro da ferida e escarafunchando até ao fundo. Volta a haver momentos confrangedores, outros wtf e até episódios que parecem recriados por termos dificuldade em acreditarmos que gente assim pode mesmo existir, mas Borat, o Filme Seguinte sai claramente por baixo quando comparado com o antecessor.
A primeira razão é porque, desta vez, já não estamos despreparados, como estávamos da primeira vez. Isso também obriga a que, muitas vezes, Sacha Baron Cohen tenha que ir para as situações mascarado, o que é estranho de ver. Afinal de contas, é Cohen mascarado de Borat, mascarado de americano. A segunda razão é porque, na maioria das vezes, as situações nunca se desenrolam como seria de esperar, com reacções mais razoáveis do que seria expectável ou mais contidas. E a terceira razão é porque, muitos dos episódios, não têm propriamente qualquer interesse, como aquele em que Borat vai a um comício de Donal Trump mascarado do próprio. Claro que, no final, existe o episódio com Rudy Giuliani de que já toda a gente ouvir certamente falar por esta altura – e é por ele que o filme será para sempre recordado. Mas apesar de Giuliani ser um dirty old man, há todo o esquema de emboscada em redor do episódio que lhe tiram o impacto que querem que tenha.
Borat, o Filme Seguinte não é descartável, antes pelo contrário. Afinal de contas, Sacha Baron Cohen sabe o que faz e há piadas inteligentes e momentos realmente com graça (incluindo um cameo de Tom Hanks). Contudo, como um todo, Borat, o Filme Seguinte nunca funciona, limitando-se ao programa de apanhados para a televisão (o que não deixa de ser irónico, tendo em conta que esta é uma produção para um dos sistemas de streaming que vieram mudar a forma como consumimos cinema). É obrigatório ser visto, até para auscultarmos o pulso aos Estados Unidos, mas preparem-se para o Happy Meal.
Título: Borat Subsequent Moviefilm: Delivery of Prodigious Bribe to American Regime for Make Benefit Once Glorious Nation of Kazakhstan
Realizador: Jason Woliner
Ano: 2020