| CRÍTICAS | Da Eternidade

O cinema de Roy Andersson é um dos mais particulares de toda a sétima arte. Mesmo para quem esteja familiarizado com o humor escandinavo, o cinema de Andersson é extremamente… único. É tão seco, tão seco, tão seco, que se torna comédia pelo desconforto. Roy Andersson leva o genérico, o banal e o circunstancial até ao limite, redefinindo todos os conceitos de absurdo.

Além disso, o seu cinema também não tem particularmente uma linha narrativa. São antes uma sucessão de episódios, em que pousa a câmara em planos fixos e altamente meticulosos. Mais do que o formalismo de um Kubrick, cada cena de Roy Andersson é como se fosse um diorama humano, ocupado por actores não profissionais, que ajudam ainda mais a conferir uma atmosfera de artificialismo a toda esta composição… particular.

Da Eternidade, o seu primeiro trabalho após aquela que se convencionou chamar de Trilogia do Ser Humano, é tudo isto, mas ainda mais a fundo. Roy Andersson depura ainda mais este mecanismo, fazendo com que cada episódio do filme seja ainda mais surreal, mais absurdo, mais desconfortável ou mais trágico. Seja para os seus personagens, seja para nós, espectadores, que muitas vezes não sabemos como reagir ao que estamos a ver.

Da Eternidade é um conjunto de episódios (aforismos?), que tanto podem ser sobre um pai a atar os atacadores à filha à chuva como sobre Adolf Hitler num bunker durante a queda de Brlim, mas que são todos eles sobre a insignificância cósmica do ser humano no universo. Ou seja, todos aqueles momentos são, à sua maneira, o exacto momento em que determinada pessoa choca de frente com a consciencialização da eternidade, seja por perceber como esta é infinita, seja por se aperceber que esta é limitada no tempo.

A única personagem recorrente do filme é um padre em depressão, depois de ter percebido que perdeu a fé em Deus. Haverá algo mais tragicamente irónico? E isso faz de Da Eternidade um filme também extremamente espiritual, mas uma espiritualidade que se encontra nas pequenas coisas da vida – num carro avariado à beira da estrada, na neve a cair lá fora na quadra natalícia… – e não na igreja, da prece ou em qualquer divindade.

Tal como os seus anteriores filmes, Da Eternidade é um filme extremamente… único, que ou se adora ou se odeia. Para quem não sabe ao que vai, basta ver os primeiros 10 minutos. Se não entender o que está a ver, então escusa de continuar a insistir, isto não é para si. Se não entender, mas, por alguma razão, se sentir apegado ao que está a ver, então continue. O sueco tem melhores McBacons, não tão depurados como este, mas é uma excelente porta de entrada para o seu corpo de obra. Para quem já conhece o seu trabalho, então não vale a pena ler nada disto, porque já sabe o que o espera.

Título: Om Det Oändliga
Realizador: Roy Andersson
Ano: 2019

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