Quando se fala nos escandinavos normalmente é para os elogiar. Eles são todos lindos e maravilhosos, simpáticos e humanistas, poços de virtude sem fim. Os dinamarqueses então são os mais felizes do mundo e até têm uma palavra própria, que tem servido para vender milhões no mundo do wellness e afins – hyggelig. E, no entanto, andam os realizadores dinamarqueses (especialmente Lars Von Trier e Thomas Vinternberg) há décadas a alertar-nos de que não é nada disto, que são todos fucked up da cabeça. E no seu mais recente Mais uma Rodada, Vinterberg aborda outro problema estrutural da Dinamarca (e da Escandinávia em geral): a sua forte drinking culture.
A Festa, apesar de ter sido o seu primeiro trabalho já no ido ano da graça do Senhor de 1998, continua a ser tomado como a medida de todos os seus filmes, sempre que Thomas Vinterberg lança algo de novo. E o certo é que, exceptuando talvez The Hunt – A Caça, o dinamarquês nunca repetiu o mesmo estado de graça. Com Mais uma Rodada parecia haver material suficiente para fazer um novo brilharete, mas este acaba sempre por estar mais perto de A Comuna do que de A Festa. Não é claro quanto esse, mas Mais uma Rodada volta a parecer um filme de crise de meia idade, sobre quatro homens que procuram recuperar a vitalidade (e os sonhos) de um período em que eram invencíveis e tudo parecia ser possível.
Esses quatro homens são Mads Mikkelsen, Thomas Bo Larsen, Magnus Millang e Lars Ranthe, compinchas de copos e professores na mesma escola. Ao depararem-se todos eles com os seus próprios problemas de meia idade decidem fazer um pacto, em nome da ciência (yeah, right): testar a teoria do norueguês Finn Skårderud de que o ser humano nasce com um défice de álcool no sangue e passam a estar sempre bêbados. No entanto, colocam algumas exigências: apenas podem beber durante o horário de expediente e não devem ultrapassar o limite de 0,5.
Mais uma Rodada começa por ser uma comédia ligeira, uma espécie de feelgood movie, que celebra a drinking culture. Tal como a ideia não é andarem bêbados, mas naquela linha ténue que divide o sóbrio do ébrio, também Mais uma Rodada não é um drama nem uma comédia, está ali nos terrenos da tragicomédia. Depois, como seria de esperar, a coisa começa a descontrolar-se e, aí sim, ganha seriedade. Contudo, nunca vai propriamente a fundo na questão, o que é sempre demasiado frustrante.
No final, há tragédia e redenção em iguais doses e tudo se resolve com uma dança, qual Zorba, o Grego. Tal como todo o filme, a última cena é um misto de emoções. Por um lado, Mads Mikkelsen faz uma coreografia celebratória totalmente sozinho, que é um uau; por outro lado, o tema que a acompanha – What a Life, de uns certos Scarlet Pleasure – não podia ser mais eurotrash. Talvez o McChicken saiba melhor se estivermos ligeiramente tocados com três ou quatro imperiais.
Título: Druk
Realizador: Thomas Vinterberg
Ano: 2020