| CRÍTICAS | Rifkin’s Festival

Woody Allen continua o seu lufa-lufa habitual em fazer um filme por ano, mas desta vez os olhares centraram-se antes no documentário Allen vs Farrow, sobre a acusação de pedofilia que se mantém a pairar sobre o nova-iorquino. Por isso, Rifkin’s Festival será sempre um filme secundário de Allen, que até será visto por muitas pessoas com sentimento de culpa incluído.

Depois de Vicky Cristina Barcelona, Woody Allen regressa a Espanha, desta vez para prestar tributo ao festival de San Sebastian. Mort Rifkin (Wallace “Vizzini” Shawn) é um ex-crítico de cinema em pausa sabática enquanto tenta terminar o the great American novel que acompanha a mulher (Gina Gershon) até o festival, onde ela vai assessorar Philippe (Louis Garrel), o novo ai-jesus da realização mundial. Com o casamento em crise, Rifkin’s Festival vai-se desenrolar como uma sucessão de pequenas vinhetas, sobre os grandes temas da condição humana (e do corpo de obra de Allen): a vida, a morte e o amor.

Não há nada de novo em Rifkin’s Festival, que repisa todas as pegadas da filmografia anterior de Woody Allen, a saber: um alter-ego seu, altamente neurótico; a paixão por mulheres mais novas; o caos felliniano (especialmente na cena em que Elena Anaya apanha o marido na cama com outra); a psicanálise; e a influência do cinema europeu. Pelo meio ainda há tempo para tirar meia dúzia de postais de férias e agradar aos produtores, numa gesto que se tornou habitual nesta última fase de Allen, em que andou a filmar pela Europa, patrocinado pelas cidades que viam aqui potencial turístico.

A grande novidade em Rifkin’s Festival é a carta de amor que Allen escreve ao cinema e às suas grandes referências. Quer dizer, não é bem uma carta, é mais um e-mail, já que este é um filme mais modesto. Essa homenagem é feita, em primeiro, pelo conflito gerado entre Rifkin (intelectual e erudito, apaixonado pelos grandes mestres europeus, da Nouvelle Vague a Ingmar Bergman) e Philippe (que refere os clássicos como Ford ou Hawks como os seus mentores espirituais), o que é desde logo curioso, tendo em conta que o norte-americano é que bajula os europeus e o francês é que exalta os americanos.

Depois, o tributo é concluído com uma série de sonhos em que Woody Allen emula cenas marcantes de filmes dos mestres, de O Mundo a Seus Pés a O Anjo Exterminador, passando por O Desprezo ou O Sétimo Selo (neste último aparece Cristoph Waltz para jogar xadrez com Rifkin na praia, na melhor cena do filme). E é estes momentos que o realizador se torna em Allen vintage, com o seu humor mordaz característico, que aproxima Rifkin’s Festival de Hollywood Ending e de A Rosa Púrpura do Cairo no seu amor pela sétima arte. E é isso que vale o Double Cheeseburger.

Título: Rifkin’s Festival
Realizador: Woody Allen
Ano: 2020

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *