| CRÍTICAS | Evereste

O Monte Evereste, com os seus quase 9 mil metro de altitude, é o ponto mais alto do planeta e só foi alcançado pelo Homem em 1953 (pelo menos oficialmente). Durante 40 anos manteve-se como um dos pontos mais inacessíveis dos planeta, até que, nos anos 90, o alpinista neozelandês Rob Hall teve uma ideia de génio: organizar subidas turísticas à montanha. Outros seguiram-lhe o exemplo e, a partir daí, o Evereste tornou-se quase numa romaria. A comercialização da montanha Nepalesa cresceu de tal forma que, em 2019, uma foto de um engarrafemento(!) no topo do Evereste tornou-se viral. E isso para não falar do trilho de cadáveres que se espalham pelos trilhos, dos montanhistas que não vão sobrevivendo à subida e cujos corpos não conseguem ser resgatados.

No entanto, a primeira vez que essa comercialização galopante do Monte Evereste fez correr verdadeiramente tinta foi em 1996, quando 8 alpinistas morreram num só dia da época alta do turismo de montanha, incluindo o próprio Rob Hall. Uma tempestade feroz apanhou três expedições desprevenidas e as baixas foram inevitáveis. A opinião pública mostrou-se chocada e discutiu-se se essa turistificação do perigo fazia sentido. Resultado? Manteve-se tudo na mesma.

Em 2015 Hollywood aproveitou para fazer um filme sobre esse evento, capitalizando ainda mais a desgraça alheia. Por ironia do destino, durante as filmagens do filme, uma derrocada de neve acabaria por matar 16 sherpas, os nepaleses que vivem na montanha e ajudam nas expedições como guias. Apesar de ter sido um número de baixas mais alto que o do episódio que o filme reconstituía, mais uma vez ninguém quis saber, até porque as vítimas nem sequer eram brancas. Fez-se o filme e pronto, eis mais alguém a lucrar com as expedições ultra-radicais ao ponto mais alto do mundo.

Evereste é assim o filme-tragédia que conta a história dessa fatídica expedição de 1996, em formato coral. São muitos nomes conhecidos no elenco, mas de forma algo inexplicável o filme acaba por não se interessar por nenhum deles. Existem inclusive actores que são meros figurantes em Evereste: Keira Knightley e Robin Wright, as esposas que ficaram em casa, ou mesmo Jake Gyllenhaal, na pele do famoso alpinista Scott Fischer, o outro nome famoso que haveria de perder a vida nesse tal dia. Depois existem outros actores que hão de desaparecer a meio do filme, pura e simplesmente como se ninguém se lembrasse mais deles, como Michael Kelly, por exemplo, na pele do jornalista Jon Krakauer.

Salvam-se então Jason Clark, que interpreta o próprio Rob Hall, e Josh Brolin, porque a sua sobrevivência tem contornos de filme de super-heróis. São estas duas histórias que servem minimamente para fazer o filme desenrolar-se de forma quase automática e funcional. Apesar de ser um filme de aventura, sobre um grupo de alpinistas que procura alcançar o pico mais alto do planeta, Evereste fica sem fôlego muito cedo. Para começar perde uma hora a preparar a subida e a começar a expedição até ao topo, tudo em piloto automático, nem sequer aproveitando os planos de postal de férias das paisagens únicas do tecto do mundo. E depois, quando a tempestade chega e Evereste se torna num disaster movie, não há qualquer emoção, vertigem ou sentimento de luta pela sobrevivência. E, para piorar tudo, o realizador Baltasar Kormákur decide apostar as fichas todas no melodrama sentimentalão, com muito tearjerker espremido até à última gota. Evereste até poderia ser um bom filme, mas ficou totalmente por fazer. E o Happy Meal não honra nada a memória dos Sherpas que pereceram durante a produção do filme nem os alpinistas que faleceram naquele dia de 96.

Título: Everest
Realizador: Baltasar Kormákur
Ano: 2015

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