| CRÍTICAS | Nattevagten

Se exceptuarmos o Dogma e o velhinho Dreyer, o que é que sabemos do cinema dinamarquês? Muito pouco ou nada, não é? E, no entanto, é um dos mercados cinematográficos onde Hollywood tem ido mais buscar inspiração. Ainda agora chegou às salas de cinema Ambulância, o remake de um filme dinamarquês de grande sucesso, o que já tinha acontecido recentemente também com O Culpado, cujo original esteve nomeado inclusive para o Oscar de melhor filme estrangeiro. No entanto, a primeira vez que Hollywood refez um filme dinamarquês foi com Nattevagten, refeito apenas três anos depois com Ewan McGregor no principal papel e baptizado entre nós como O Vigilante da Noite.

Nattevagten, que chegou a passar entre nós no Fantasporto, é um dos maiores sucessos de bilheteira de sempre na Dinamarca e foi o filme que lançou um então muito novo Nikolaj Coster-Waldau, vulgo Jaime Lannister. É precisamente Coster-Waldau que dá o título ao filme, já que é ele que vai arranjar o trabalho de guarda nocturno na morgue local, com o objectivo de amealhar uns trocos e aproveitar os tempos mortos para estudar para os exames finais da faculdade. No entanto, como é sabido em qualquer filme que se preze, estar rodeado de mortos e de cadáveres é meio caminho andado para que estranhos acontecimentos comecem a acontecer.

Estamos então no campo do thriller, que começa pelos caminhos do paranormal – ruídos estranhos aqui e acolá, portas misteriosamente abertas… – e que termina no policial, com um serial killer à solta a matar jovens raparigas. A intriga vai-se complicando e Nikolaj Coster-Waldau acaba por se tornar no principal suspeito da polícia, especialmente quando uma das vítimas é uma prostituta que tinha uma relação doentia com o seu amigo de escola, Rikke Louise Andersson.

O realizador Ole Bornedal, que também assinou o remake norte-americano, domina na perfeição os códigos e os signos do género, trabalhando o suspense da mesma forma que se cozinha com panela de pressão: atira-se lá para dentro todos os ingredientes e deixa-se Marina em lume brando, até a pressão não aguentar mais. É a escola de quem viu os filmes todos de Alfred Hitchcock e que não perde a oportunidade de deitar um olhinho a tudo o que é série b de terror no clube de vídeo (sim, estávamos em 1994, não havia internet nem streaming ainda). Contudo, Bornedal tem um erro crasso, ao revelar a identidade do assassino cedo demais, o que acaba por esvaziar logo a panela de pressão ainda bastante longe do final.

Nattevagten surge hoje, quase trinta anos depois, ligeiramente datado, não por revisar lugares-comuns do género, mas por já o tempos visto feito e refeito milhentas vezes desde então. No entanto, Ole Bornedal sabe que o diabo está nos detalhes e, por isso, destaca-se por entre a espuma da rebentação com pequenos detalhes, dando atenção aos pormenores (como as traças que vivem dentro do abat-jour do candeeiro do pequeno escritório de Coster-Waldau) e às suas personagens, que não se limitam a ser bidimensionais. Não descobre a pólvora, mas Nattevagten continua a valer o McChicken sem qualquer dúvida.

Título: Nattevagten
Realizador: Ole Bornedal
Ano: 1994

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