| CRÍTICAS | Treze – Inocência Perdida

É impressionante que, numa altura em que chegou ao streaming o Phoenix Rising, a opinião pública (e a internet, especialmente) esteja entretida num voyeurismo abjecto com o julgamento de Johnny Depp e Amber Heard. É que os que culpam e condenam automaticamente a actriz com veemência por ter mentido – ao mesmo tempo que são feitas outras equivalência grotescas, como considerar a saúde mental uma deficiência de carácter -, apontando o dedo ao metoo e ao feminismo, não percebem que é mesmo por isso que é preciso o metoo e o feminismo. Prova número 2: Phoenix Rising, o documentário sobre Evan Rachel Wood e a sua relação abusiva com Marylin Manson, onde este é acusado de tortura, violação ou rapto. E, na mesma praça pública onde se julga levianamente Depp e Heard, ignora-se herculeamente este caso.

Isto tudo para introduzir Treze – Inocência Perdida, o filme que marcou a transição de Evan Rachel Wood de child actress para a idade adulta. É um filme sobre uma jovem de 13 anos e o seu apetite pela destruição, que fez com que a actriz passasse a fazer, nos anos seguinte, apenas filmes em que interpretava jovens mais maduras do que a idade que tinha. E que, involuntária e inconscientemente, preparou também o público para aceitar que uma jovem de 18 anos viesse a envolver-se e a casar com um homem uns 20 anos mais velho, que muitos acreditam que tirou duas costelas para praticar a auto-felação.

Treze – Inocência Perdida é baseado na experiência real de Nikki Reed, a jovem rebelde que vive com a tia (a prima? uma conhecida? nunca se sabe bem e começa logo aí a sua tendência para manipular e mentir com os dentes todos que tem na boca) e que desencaminha Evan Rachel Wood. Esta, uma betinha que, apesar da vida familiar difícil (pais divorciados, situação financeira económica e a mãe, Holly Hunter, uma ex-alooólica em recuperação), era uma aluna de sucesso e bem-comportada, sonhava em ser popular. Por isso, quando se tornou bff da miúda rebelde da escola, a sua ascensão social foi rápida, mas abriu também uma porta para as drogas, para o roubo, para os piercings(!) e para o sexo.

Larry Clark foi o primeiro a alertar os pais deste mundo para o que os filhos andavam a fazer quando eles não estavam a ver. E Treze – Inocência Perdida segue essa mesmo provocação, esfregando nas nossas caras com provocação esse choque. É, por isso, um filme cheio de angústia adolescente e, por essa ser feita de extremos e de exageros, é fácil confundir-se com sensacionalismo barato e gratuito. Por isso, rapidamente Evan Rachel Wood está apenas a acumular problemas e comportamentos de risco – distúrbios alimentares, cleptomania, cortar-se nos braços… – sem que haja qualquer reflexão sobre isso. Ah, há um pai ausente, mas também há uma ideia de orfandade do próprio filme.

Thirteen – Inocência Perdida foi um filme independente de baixo custo, feito com a boa vontade de Holly Hunter – a única e verdadeira personagem disto tudo, sobre quem deveria ser o filme – e com uma câmara ao ombro que mexe e abana mais do que se estivéssemos em alto mar. É um sinal dos tempos – era assim a MTV da altura e a ideia de um cinema jovem, informal e descontraído -, que cristaliza tanto aquele período tanto quanto as roupas e os penteados (baggy jeans, calças de cintura descaída, cabelos espetados… no fundo, o catálogo completo de qualquer boys ou girls band da altura). E, de repente, termina tudo com a redenção de Evan Rachel Wood, num arco narrativo tão apressado, quando artificial. Já na altura, em 2003, quando o vi – era então um fenómeno – não tinha gostado. Agora, confirmo que é mesmo uma Hamburga de Choco.

Título: Thirteen
Realizador: Catherine Hardwicke
Ano: 2003

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