| CRÍTICAS | Bando à Parte

É para gente como Jean-Luc Godard que existe o cinema: para que possam expressar toda a sua criatividade e genialidade. Depois existem os outros, que se vão divertindo e abusando desta máquina de sonhos. Godard é ainda um dos grandes responsáveis pelo cinema contemporâneo como o conhecemos, depois de encabeçar a Nouvelle Vague francesa ao lado de Truffaut, revitalizando o cinema francês em particular e o cinema ocidental em geral.

Jean-Luc Godard é o Tarantino dos anos 60. Ok, eu sei, é o contrário, mas assim a frase ficava mais gira. Bando À Parte é, provavelmente, o mais acessível filme do realizador francês – o filme de Godard para quem não gosta de Godard -, mas não é por isso que deixa de ser uma das suas melhores pérolas. Nele, Godard mantém de forma simples e eficaz as suas principais características, mas sem deixar de experimentar – como a mítica cena do (literal) minuto de silêncio, que infuenciou a cena do don’t be so square de Uma Thurman em Pulp Fiction), ou desconstruindo a linearidade narrativa com o recurso a um narrador omnipresente.

Bando À Parte é um heist movie de baixo-orçamento reiventado – ou pensavam que Cães Danados tinha sido o primeiro? Nele desenha-se um triângulo amoro e cúmplice, com tanto de Os Sonhadores como de Os Edukadores: Odile (Anna Karina), Franz (Sami Frey) e Arthur (Claude Brasseur). Aproveitando-se na insatisfação da primeira – teenage angst sempre a servir de combustível para as melhores aventuras -, os segundos vão pôr em prática um assalto à sua casa, que trará resultados desastrosos.

Formalmente construído como um film noir de série b, Bando À Parte passeia discrição e classe, tomando o novo e tornando-o clássico – como a mítica cena da Madison Dance, uma sequência de dança que anos mais tarde iria originar uma outra, desta vez com Uma Thurman e John Travolta como protagonistas. Nesta cena, Godard antecipa a cultura pop, ao transformar a cultura juvenil em coolness; e aqui se vê na perfeição que Godard usa a banda-sonora como… Quentin Tarantino outra vez, ou seja, como se esta fosse mais uma personagem e não um simples adorno sonoro.

Para a posterioridade fica também a cena em que os três protagonistas atravessam o Museu do Louvre em tempo recorde, que entretanto já foi batido por Bernardo Bertolluci, no seu Os Sonhadores). Bando À Parte peca apenas por demorar a arrancar – tudo o resto é de uma excelência tão simples que até irrita. E para os que nunca o viram, por favor, vão ao YouTube, chequem a cena da dança no café e digam lá que se só por ela não vale o Le Big Mac.

Título: Bando à Parte
Realizador: Jean-Luc Godard
Ano: 1964

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