| CRÍTICAS | Sorri

Se quisermos adoptar uma postura optimista e ver o copo meio cheio, podemos dizer que uma das poucas coisas boas que sobraram da recente pandemia provocada pelo novo coronavirus foi o facto da saúde mental ter deixado de ser um tabu. Basta ver como esta é uma das prioridades do actual Plano de Recuperação e Resiliência do Governo, por exemplo. E comparar com alguns números recentes para entender como é importante esta consciencialização do problema. É que, de acordo com os números oficiais, 42 por cento dos jovens nacionais denotam sinais de sintomatologia depressiva.

O cinema de terror, subgénero sempre muito atento às convulsões sociais, políticas e culturais do seu tempo, acaba por ser um reflexo disso mesmo. Basta olhar para a generalidade dos filmes de terror dos últimos tempos para ver como os traumas e a saúde mental são o grande inimigo. Sorri, o filme deste ano que conquistou a internet com a sua campanha de marketing (colocando os actores com os seus sorrisos sinistros a fazerem de emplastro em grandes eventos), é apenas mais uma dessas provas.

Sorri está para o trauma assim como Vai Seguir-te está para a sexualidade. Aqui, pessoas que assistiram pessoalmente a uma situação de suicídio, acabam por ser perseguidas por uma assustadora entidade, a qual o filme nunca se preocupa muito em explicar ou explorar. A verdade é que Rose (Sosie Bacon), pertinentemente terapeuta no hospital local, é apenas mais uma numa longa cadeia de eventos que envolvem suicídios e auto-mutilações a ser perseguida por visões de pessoas com sorrisos sinistros, que as impelem a fazerem coisas menos boas.

Não há problema nenhum em não procurar explicar o que quer que seja em relação aquela ameaça. Será um fantasma? Uma maldição? Uma entidade paranormal? Não interessa, até porque, por mais de um momento, o realizador Parker Finn deixa deliberadamente a porta aberta para mais sequelas. Alguém duvida que elas vão acontecer? Por isso, Sorri aposta sobretudo no esgotamento psicológico da sua protagonista, que não consegue dormir ou entender de forma racional o que lhe está a acontecer. E, por isso, a ameaça do filme é mais física do que propriamente assustadora.

Entretanto, Rose começa a investigar mais e a tentar perceber o que é aquela coisa que a atormenta e Sorri começa a deixar Vai Seguir-te para trás e a aproximar-se de The Ring – O Aviso. O problema é que rapidamente Parker Finn se apercebe que o argumento que tem em mãos é curto. E por mais que puxe o cobertor para se cobrir, os pés ficam sempre de fora. A solução? Remendar a coisa, da forma mais rápida e simples possível. Ou seja, enchendo os buracos e os espaços em branco com jumps scenes, monstros e outras ameaças visuais.

Depois de uma boa primeira meia-hora inicial, Sorri dispensa a malta com sorrisos sinistros e começa a apostar tudo em monstros, visões assustadoras e outros sustos fáceis e gratuitos. A partir daí é uma descida rápida por vários clichés do género, que ameaça desbaratar muito do crédito acumulado no início. No final, pior do que o Cheeseburger, só mesmo a certeza de que vamos ter que levar com mais sequelas no futuro, que serão garridamente sempre a baixar de qualidade.

Título: Smile
Realizador: Parker Finn
Ano: 2022

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