| CRÍTICAS | A Morte de um Apostador Chinês

Ben Gazzara não é só um tipo feliz, como tem muito orgulho em si próprio e no que conquistou. Um verdadeiro self-made man, vindo do nada, que Pegu num cabaret decrépito – o Crazy Horse West – e o transformou num negócio lucrativo. Quer dizer, Ben Gazzara pode não ser podre de rico, mas tem o suficiente para manter o negócio a fluir, não ter dívidas, ter várias namoradas jovens e bonitas e manter uma vida com certos luxos.

Ben Gazzara pertence ao mesmo mundo de italo-americanos do qual tirámos um curso, um mestrado e um doutoramento com o cinema de Martin Scorsese (aliás, consta que a ideia para A Morte de um Apostador Chinês nasceu numa noite de copos entre esse e John Cassavetes) e, por isso, não nos surpreendemos ao vê-lo sucumbir à tentação do jogo. Numa noite de cartas, num casino clandestino, Gazzara fica com uma dívida de 23 mil dólares. E todos sabemos o que uma dívida destas representa nestes círculos.

Tal como nos filmes de Scorsese, A Morte de um Apostador Chinês é sobre honra, compromisso e lealdade. Mas não só. É também sobre a perversão do dinheiro e como o capitalismo é o verdadeiro obstáculos a todos os nossos sonhos. Gazzara dizia que inclusive que este era um filme biográfico do próprio Cassavetes. A dívida ao jogo fazia aos sonhos da sua personagem o mesmo que a dificuldade em financiar os seus filmes fazia ao realizador.

No entanto, é o cinema de Cassavetes que faz o filme acontecer. Com o seu realismo de rua e a sua câmara ao ombro, de quem declarou guerra ao uso de tripé, Cassavetes filma sem barreiras, de forma directa, transformando A Morte de um Apostador Chinês num filme cru e de sentimentos à flor da pele. Por isso, quando Gazzara é colocado entre a espada e a parede e mandado ir matar um chinês chefe da máfia de Chinatown para compensar a sua dívida, o filme esvazia-se num cops and robbers movie, para o qual não estávamos necessariamente à espera.

A Morte de um Apostador Chinês ainda há de regressar à sua fórmula inicial, para um último acto que transforma tudo numa tragédia grega clássica (em que o coro é substituído pelos números semi-decadentes do seu cabaret, onde aparece muito brevemente Haji, uma das musas de Russ Meyer), mas já não há de ser a mesma coisa. No entanto, teremos sempre Ben Gazzara, que teve aqui o papel da sua vida. E por falar em McChickens, já viram alguma vez o remake português, Cabaret Maxime?

Título: The Killing of a Chineese Bookie
Realizador: John Cassavetes
Ano: 1976

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