| CRÍTICAS | As Virgens Suicidas

Tudo começa com uma tentativa de suicídio e não, não é um spoiler, porque, além de ser assim que começa, é também esse o título do filme. Por isso, As Virgens Suicidas é uma tragédia anunciada, onde a morte vai, mais cedo ou mais tarde, acontecer.

Além dessa tensão que se sente no ar durante toda a duração do filme, há ainda outro sentimento que trespassa As Virgens Suicidas: é o da nostalgia. Por isso, é quase um filme sensorial. Para isso, a então debutante Sofia Coppola recorre a uma fotografia de cores desbotadas (décadas antes de surgir o Instagram e todos os seus filtros) e a música, especialmente a banda-sonora dos Air. Nada de admirar vindo de uma realizadora que chegava do mundo dos teledisco, nomeadamente da pop mutante dos Flaming Lips. Playground Love, quase a theme song do filme, é uma espécie de sonho doce e narcótico, como se alguém tivesse encharcado o algodão doce em valium.

Como disse, tudo começa com uma tentativa de suicídio. Cecilia (Hanna Hall), uma das cinco irmãs Lisbon, corta os pulsos na banheira. A partir daí, se as manas já viviam uma educação religiosa apertada e espartana, às mãos dos pais James Woods e, especialmente, (uma genial) Kathleen Turner, tudo fica ainda mais vigiado e controlado. As Virgens Suicidas vai então contar a balada destas irmãs, mas fa-lo pelos olhos dos rapazes do bairro, que desenvolvem uma espécie de obsessão pelas raparigas.

Apesar de haver uma que se destaca claramente – Kirsten Dunst -, as manas Lisbon são sempre uma entidade colectiva. E todas as interpretações e motivações são analisadas através do filtro que são os rapazes do bairro. Eles são espectadores do filme tal e qual como nós. A única diferença é que estão lá dentro e nós estamos lá fora.

Há ainda em As Virgens Suicidas os típicos sinais de uma primeira obra, ponde Sofia Coppola não tem receio de arriscar várias coisas diferentes. Com um pé no (verdadeiro) cinema independente norte-americano e com outro já no futuro, a rir a porta a várias tendências que aviam de vir para ficar, Sofia Coppola experimenta umas coisas que funcionam (os flares, que haveriam depois de se tornar num flagelo do cinema pós-moderno, uns olhos que brilham tal como a fotografia de La Jetée pisca o olho, uns split screens…) e outras que nem por isso (uma timelapse totalmente despropositada…). Mas tudo isso confere personalidade ao filme. Com este Le Big Mac, Sofia Coppola apresentou-se ao mundo como realizadora de corpo completo, ao mesmo tempo que se redimia de ter arruinado O Padrinho III. Nada mau.

Título: The Virgin Suicides
Realizador: Sofia Coppola
Ano: 1999

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